Em meados da década de 80, numa companhia japonesa que, segundo alguns comediantes portugueses, parece ter nome de fruta, os tipos lá de cima deram um projecto a um senhor chamado Hideo Kojima. O título viria a ser conhecido como Metal Gear e teria como protagonista o grande Solid Snake.
Era a produção de um videojogo com temática centrada na “guerra”, para a família computadores MSX. A ideia era fazer algo as estilo do Commando da Capcom. Um jogo rápido e frenético de tiros.
Só que havia um pequeno problema… MSX era uma valente porcaria a fazer scrolling! Aquilo parecia que ia aos solavancos. Se queres ter uma ideia de como era a máquina, experimenta ir ao Youtube e compara a versão de arcada do Gradius/Nemesis com o port para a MSX. Até dói só de ver não é?
Então, Kojima teve uma ideia: e se fizermos as coisas ao contrário? Um videojogo onde o ideal é levar as coisas com cuidado e onde devemos evitar os inimigos? Um jogo de espionagem e infiltração! … A direcção da empresa achou que a ideia nunca ia pegar.
O projecto inicialmente era conhecido por Intruder, mas a versão final foi baptizada com um nome que hoje em dia é ligeiramente mais familiar… Nesta Odisseia de um Bit vamos revisitar o Metal Gear da Konami.
Ao longo dos anos foram relançadas várias edições de esta obra, mas no fundo existem apenas duas versões do jogo. A original, lançada no computador e mencionado acima, e um port feito por outra equipa para a NES da Nintendo que não tem qualquer envolvimento com Kojima. Hoje vamos focar exclusivamente na versão original, até porque é a única que faz ligação com os títulos posteriores mais populares, e a única que marcou presença em consolas mais recentes.
Apesar da complexidade das histórias que Kojima criou no futuro, influenciadas pela sua paixão por Hollyhood, Metal Gear é um videojogo comparativamente simples, apesar de ser inspirado pelo Exterminador Implacável, Nova Iorque 1997 e o género de filmes de espiões.
O protagonista é Solid Snake, soldado das forças especiais Foxhound. A sua missão é infiltrar a fortaleza de Outer Heaven, resgatar o seu compatriota Gray Fox e destruir o Metal Gear TX-55. Este último, trata-se de um robô bípede extremamente perigoso capaz de lançar armamento nuclear. No entanto, perguntas-te que equipamento especial foi concedido a Snake para completar a missão? Um maço de cigarros e um radio para comunicar com o seu comandante, Big Boss.
Como numa espécie de Legend of Zelda da espionagem, Snake têm de adquirir vários itens para progredir na sua missão, explorando os 3 edifícios de Outer Heaven. Máscara de gás, óculos de infravermelhos e cartões de acesso, são alguns dos exemplos. Entrar em contacto via rádio com outros opositores das forças de Outer Heaven, também é uma necessidade.
Quem já jogou algum jogo da série, sabe o que implica enfrentar as forças inimigas. Snake deve, sempre que puder, evitar ser descoberto pelos soldados de Outer Heaven e os seus sistemas de seguranças. Para isso o protagonista tem de usar todas as manhas que tem à mão. Com isto, atacar o inimigo com um ataque surpresa, esconder em caixas de cartão, etc… Se Snake é descoberto, assinalado com pontos de exclamação em cima do inimigo, o alarme é accionado e o jogador é completamente bombardeado com os reforços das forças inimigas.
Para fugir do alcance do alarme, temos de mudar de sala ou até mesmo andar dependentes da severidade do alerta. Em alternativa, podemos simplesmente usar as nossas armas de fogo para tratar do serviço, mas claro, os nossos recursos são limitados, e nem sempre são fáceis de repor sem termos de andar ás voltas por toda a Outer Heaven. Além disso, todo o equipamento é essencial para derrotar os vários bosses, portanto tens de andar com pezinhos de lã!
Assim por alto, o videojogo não parece assim muito diferente das entradas um pouco mais recentes da série… Mas como seria de esperar, a primeira iteração de uma grande ideia ainda tem muitas pontas aguçadas para polir. O campo de visão dos soldados inimigos é completamente reduzido, uma mera linha horizontal até ao limite da sala fácil de evitar. Não há qualquer tipo de radar. A história é praticamente inexistente. Os bosses normais são relativamente simples e sem grandes traços característicos. O videojogo usa um sistema de salvamento de reféns, que estraga completamente a tua playthrough sem aviso, se acontecer algum problema grave… Entre outras peculiaridades bem estranhas.
Mas já se notavam alguns traços, que se iriam tornar em características bem conhecidas da série e do estilo de produção de Kojima. Por exemplo: a partir de certa altura do jogo, Snake começa a ser bombardeado com informação falsa na tentativa de sabotar a sua missão. Isto inclui uma ordem ao jogador para desligar a consola. Este problema, culmina num plot twist relativamente à verdadeira identidade do líder de Outer Haven. Algo que era surpreendente na altura, mas que é do conhecimento comum hoje para quem jogou as entradas seguintes. O próprio Snake já começava a criar paixonetas com as “Bond Girls” da semana… O quê? Pensavas que a Meryl era especial? Pff… Ela nem é a segunda da lista.
É verdade que Metal Gear não envelheceu muito bem, mas ainda está entre os melhores videojogos da era de 8-bit.
Não deixa de ser a grande semente que germinou a enorme saga de Solid Snake e Big Boss, e que está ligado a um dos desentendimentos entre Kojima e a Konami (sim, esta telenovela já tem décadas). Desentendimento este que deu origem a uma das melhores sequelas de toda a indústria. Uma sequela que definiu, finalmente, a verdadeira identidade de toda a franquia – mas essa é uma história (ou uma odisseia) para outro dia.
Fica a conhecer mais Odisseias de Um Bit.