Numa era onde cada vez os jogos são mais divisíveis e inconstantes no panorama competitivo, nomeadamente em jogos de combate, os modos single-player são, na minha óptica, cada vez mais vitais.
Partindo do início, irremediavelmente servem para contextualizar e informar sobre o jogo em si, quer das suas personagens, quer motivações ou ambiente. Tenho a certeza que muitos destes aspectos já recaíram da escolha da vossa personagem, não pela sua forma de jogar ou sistema, como também pelo seu pano de fundo.
Emoções à Flor da Pele
Quem não soltou uma lágrima no final do King no Tekken 2? Quem não sentiu a emoção do final de Ryu em Street Fighter Alpha 3? Quem não soltou uma gargalhada quando o Paul Phoenix foi apanhado e multado por um polícia, ou nas inúmeras interacções de personagens em Dragon Ball Fighter Z?
Devido a estas, sentimos ligação com as suas personagens. As suas motivações também passam a ser as nossas, em certo sentido, sentimos também a sua jornada ao longo das várias entregas.
Foi um prazer assistir ao domínio do Dark Hadou do Ryu em Street Fighter V. Quem acompanhou o eterno desafiante sabe, sem surpresa, que o nosso herói sempre batalhou internamente contra este estado. Aos vários regressos que tanto caracterizam a série The King of Fighters, ou inexplicavelmente ao retorno de Kazuya em Tekken 4, quando todos pensavam que o anterior herdeiro da Mishima Zaibatsu estaria morto e feito em pó, quando foi atirado para o magma de um vulcão, voltou para reclamar o que era seu.
Sem surpresa, queremos saber o propósito, a continuação das histórias e modos de vida das nossas personagens. Por esse mesmo motivo, também estamos a assistir a um reverso. Mas, como já disse, cada vez mais divisivo por dois grandes pólos: a elite e o jogador casual.
Transição de Géneros
A Arc System Works é conhecida não só pelos seus visuais e jogabilidade nas suas séries, como também por oferecer um dos modos de história mais completos, rivalizando muitos géneros – até as Visual Novels e JRPGs.
Um dos casos mais notáveis foi com Persona 4 Arena, no qual até continua canonicamente o enredo de um JRPG de sucesso, enriquecendo não só o desenvolvimento das suas personagens, como da história em si. Por si só, os milhares de fãs de Persona 4 abraçaram este jogo, mesmo sendo um género completamente diferente do que jogaram.
Para a transição de géneros, a empresa enveredou por um sistema de combos automático e simplificado, uma mecânica cada vez mais patente no seu género. Aqui, a elite fez cara feia, porque o mercado competitivo abomina este tipo de adições – para muitos causaliza, tira o foco, e faz com que o jogo perca o seu conteúdo.
No entanto, é preciso ter em conta quando o título é um apelo para os fãs.
Conteúdo para os Fãs
O recentíssimo Boku no Hero Academia: One’s Justice, ou os inúmeros títulos do Naruto, são alguns destes casos. É certíssimo que o seu foco são os fãs da série – muitos apenas querem ver a explosão dos seus ataques favoritos no ecrã, sentirem-se bem ao encarnarem as suas personagens ou, simplesmente, soltar raios das palmas das mãos com o simples toque de botões. Porque explosões e disferir golpes a velocidade da luz é divertido.
Já tive a possibilidade de jogar ao Boku no Hero Academia. É simplesmente divertido, pelo que transmite tudo ao público que consegue alcançar. Porém, não deve ser visto como algo mais. São jogos divertidos e funcionais. O pior é que, a longo prazo, tornam-se repetitivos.
O Melhor de Dois Mundos
Na minha memória, só tivemos três casos onde um jogo baseado numa licença, que conseguiu apelar ao seu público e ao mercado competitivo: Hokuto no Ken da Ark System Works, Dragon Ball Fighter Z da Bandai Namco Entertainment, e JoJo’s Bizarre Adventure da Capcom. (Atenção que, neste último, não me refiro aos jogos All Star Battle e Eyes of the Heaven. Esses, claramente, são para os seus fãs unicamente.)
O que distinguem estes três títulos dos que já falei, é a sua jogabilidade, a maneira como jogas e o treino que todos requerem.
De todos, eu penso que Dragon Ball Fighter Z é aquele que consegue melhor replicar este efeito, sendo incrivelmente bem recebido pelos seus fãs, bem como orgulhosamente para o seu mercado competitivo. Isto, porque – sejamos realistas – são quem mantêm o jogo vivo.
O jogo de Goku e todos os guerreiros Z envereda também por auto-combos, mas o input de comandos é muito avançado para quem decidir aventurar-se e dedicar o seu tempo no laboratório. O seu sistema de comandos é, também, muito natural, porque parece que a Ark System Works, neste panorama, pensa o mesmo que eu: ou seja, que um jogo competitivo não se rege pela dificuldade de introdução de comandos, mas sim pela agilidade e oportunidade que estes possibilitam.
Como se não fosse suficiente, esta franquia dá-nos o poder de escolha até para quem desejar apenas puro fanservice, com a série Xenoverse. Esta (não destoando também da mesma) é fantástica e continuam a ser entregues novos conteúdos descarregáveis com regularidade.
Disponibilidade de Modos
Contudo, o Story mode, ou, na sua ausência, o Arcade mode, são bem importantes (mais do que uma motivação de desbloqueio de personagens ou modos) também pela possibilidade de podermos testar tanto diversas personagens como mecânicas, sem a intimidação de jogarmos tanto contra alguém do outro lado do planeta, como o nosso vizinho do lado.
Testar e aperfeiçoar técnicas avançadas como combos ou mecânicas, primeiramente, deve ser feito durante horas a fio, e não saltando logo para o modo online. Quando Fighting EX Layer foi colocado à venda, apenas teve o modo online, onde o jogador, se quisesse progredir, teria de fazê-lo neste ambiente. Isto traduziu-se num abandono muito prematuro.
Felizmente, a Arika rectificou o caso, oferecendo um Arcade Mode na sua última versão, quer na Playstation 4 como no lançamento na Steam, e ainda conteúdo extra. Contudo, penso ser necessário, de futuro, demonstrar as motivações dos seus protagonistas. Mas, para já, é tudo o que temos.
Abandono no Single-Player
Este abandono no single-player começou a notar-se mais com Street Fighter V que, felizmente, soube, aos poucos, reinventar-se, oferecendo um modo de história cinematográfico ao estilo de Mortal Kombat, e diversos modos de jogo.
Existiram casos, quer no presente quer no passado, onde o mesmo enriqueceu tanto o seu jogo, que muitos até associaram-no ao mesmo. O já referido Mortal Kombat (IX) ofereceu um dos modos para um jogador do mais divertido e estranho que possam imaginar. O Challenge Mode é muito mais do que uma introdução de comandos, que, além de ser necessária, não deve ser de todo limitada a este fim.
Neste modo escalamos uma torre, onde todos os tipos de peripécias devem ser superadas para chegarmos ao seu topo. Desde tarefas mundanas como testar a nossa visão, sorte, até desafios impossíveis como defrontar dois Shao Khan, logo imediatamente depois de derrotar Goro e Kintaro em combate.
A Nostalgia do Passado
Voltando um pouco atrás na história, assistimos a um dos mais interessantes, e continuo a achar estranha a sua ausência quer na sua série como no âmbito deste género.
Em Street Fighter Alpha 3, para as consolas, pudemos desfrutar de um fantástico modo que conseguiu replicar por completo a jornada dos world warriors. No World Tour, depois de escolhermos o nosso lutador de rua favorito, podemos viajar pelo globo e combater contra os restantes guerreiros. Neste modo, a nossa pontuação é equivalente à nossa experiência e além de melhoramos os atributos do nosso lutador, desbloqueamos habilidades extra que vão desde saúde, velocidade ou imunidade a tonturas, por exemplo.
Realmente, é um modo de jogo bastante diversificado e único mas que, infelizmente, apenas pode ser usufruído neste título. Continuando ainda dentro de modos de jogo RPG em jogos de combate, temos outro que é bastante recordado pelos seus fãs. Isto porque, de certa forma, também recria a viagem ao mundo de Alpha 3:
Em Dragon Ball Z Budokai 3, enquanto Goku com os seus aliados ou inimigos, podemos viajar pelo planeta, visitar lugares nostálgicos, conversar com as personagens, e ao mesmo tempo também recriamos os momentos desta genial série. Com Ehrgeiz da Dream Factory (série recorrente de Tobal nº1), além do muito limitado Arcade mode, tínhamos um modo de RPG ao estilo dungeon crawler, que explicava melhor os acontecimentos das nossas personagens e no jogo.
Os Verdadeiros Campeões
Porém, talvez a série que mais inovou e fez do seu single-player a sua maior força, é a irmã de Tekken – falo de Soul Calibur.
Em todos os sentidos, revolucionou a maneira como um jogo de combate deve ser produzido. Sem dúvida que perdemos mais horas a percorrer o mapa tentando adquirir armas extra no seu primeiro jogo, conquistar um reino no terceiro e, claro, oferecer o mais completo modo de personalização de personagens alguma vez criado para um videojogo, fazendo corar de vergonha inúmeros títulos RPG. Certamente, muitos de vocês adquiriram o quarto, quinto, e mais recentemente sexto jogo, apenas por este modo.
Numa altura que a sua utilização e destaque são tão escassos, bem como muitos até afirmarem serem dispensáveis, certamente que agora já devem ter uma visão mais limpa e justa do quão importantes são para o seu género e do valor que conseguem transmitir.