Depois do cinema explorar os universos fantásticos das comics até a exaustão, parece chegou a hora de enveredar aos poucos pelo imaginário das obras anime. Logo após de um mediano Ghost in the Shell para o grande ecrã, chega a vez do anjo de combate, Alita, dar o passo para as salas de cinema. Vamos agora descobrir, se este projecto ambicioso que esteve em desenvolvimento por vários anos, fez jus à lendária obra de Yukito Kishiro, de onde tira as suas inspirações.
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Alita, transporta o espectador até um futuro muito distante, onde a linha que separa a robótica e o homem está presente por um fio muito ténue. A terra vive um clima pós-apocalíptico, após um acontecimento denominado de Queda. Enquanto as classes mais baixas vivem nos solos do nosso planeta, os afortunados vivem numa plataforma, chamada Zalem. Dr. Ido é um cyber-cirurgião que certo dia encontra uma carcaça cyborg de uma adolescente numa sucata. Esta é dotada de algo pouco comum: um cérebro humano, ainda intacto, mas sem memórias do seu passado. Imediatamente o benevolente doutor, reconstrói-a, e oferece-lhe o corpo e nome da sua falecida filha, Alita. Alheio a tudo, desconhece que este encontro e Alita, serão os catalisadores para a salvação e união dos dois mundos.
Sem sombra de dúvidas a dupla de James Cameron e Robert Rodriguez, pensou neste filme já com sequelas em mente. Não só os acontecimentos, como o nome verdadeiro de Alita, ou o seu passado demasiado vago, ficaram propositadamente postos de lado para serem explorados possivelmente numa trilogia. Mas não se enganem, pois esta obra segue quase a par e passo as vinhetas de Kishiro, apenas eventos como o corpo Berserker de Alita, a obtenção da poderosa e icónica Damascus Sword, e um vilão condensado em três, foram alguns dos seus ajustes.
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O filme apresenta-se inicialmente com algumas engrenagens a estrebucharem por alcançar um ritmo, mas é cativante o suficiente para o espectador saber que este é um processo necessário para poder abraçar a mesma. Já por si, e em comparação com o manga de onde esta adaptação é originária, podemos notar que na escrita James Cameron poupo-nos a muitas partes de encher chouriços, pelo que o que assistimos é mesmo o puro da acção, mantendo-nos assim sempre na descoberta da rota do filme e com a adrenalina a bombar. Por isto, e embora demore um pouco a arrancar totalmente, é extremamente importante para qualquer espectador, alheio à obra original, levar com toda esta informação, sobretudo tendo a consciência de que estamos a ver o “prólogo” da história que o nosso anjo realmente nos conta.
Com isto, há algo a que sem dúvida não posso deixar de dar algum destaque nesta análise: os detalhes super bem pormenorizados do CGI. Detalhes esses como a pele da própria Alita, que logo a partir do primeiro close up do filme, ganhou toda uma vitalidade muito humana e natural… algo que me arrepia ligeiramente. Esta tornou-se na melhor e mais perfeita personagem CGI que já vi até então. O próximo passo a seguir a Avatar. Claro que isto deve-se em grande parte ao trabalho da equipa de modelação, de texturas e claro aos animadores, mas considero que o tratamento das luzes também foi aqui um ponto fulcral para conseguir-se trazer toda esta naturalidade à personagem no rendering, camuflando-a em cena tão brilhantemente.
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Porém vão existir momentos onde a linha entre o CGI e atores reais parecerá demasiado artificial, até mesmo em contornos deste calibre, basta verem o olhar completamente anime do nosso anjo de combate protagonizado por Rosa Salazar, face às outras personagem, que embora perceba o seu contexto, não deixou de parecer bem estranho por ser levado demasiado à letra. Por fazer desta a sua regra, o elenco de actores foram quase escolhidos a dedo, ficando um elenco muito semelhante e próximo da sua versão original, o que verdadeiramente é uma lufada de ar fresco, ainda para mais quando estamos a falar de uma obra anime transitada para o grande ecrã.
Fora deste campo, o filme esteve mesmo irrepreensível, com uma direcção dinâmica, uma fotografia com perspectivas profundas e características de vinhetas, e uma luminosidade de pincelar os planos com toda a sua carga dramática a preencher os cenários monocromáticos. Estes últimos, reflectem uma mistura cultural assente num mundo pós-apocalíptico, mas que nos surpreende com a presença de alguns letreiros bem portugueses, que não são de todo escassos, e onde podemos ler palavras como “cigarros”.
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A acção kinética realizada por Robert Rodriguez, foi um deleite visual. O filme é dotado muito possivelmente de uma das melhores coreografias de combate! Realmente não existem reparos para enaltecer Alita, enquanto disfere a sua arte marcial Panzer Kunst, nos seus adversários, ou no frenético desporto Motorball. Com base neste ponto, apenas acho a faixa etária muito errada para este filme. O grafismo da obra original ficou praticamente intacto, por isso preparem-se para verem membros a esvoaçar pela tela de cinema, violência extrema, e temas profundos para uma criança de 12 anos de idade acompanhar e perceber. Existe também romance e temas mais levianos, como a vida de Alita na sociedade, cujos são brutalmente apagados não só em prol da acção narrativa, como para desumanizar o nosso jovem anjo. Já no som, este é característico de obras cinematográficas de grande calibre, onde o épico anda de mãos dadas com a acção pura e dura.