A saga Atelier, já veterana no mundo dos videojogos e dos JRPGs em geral, começou em 1997 com o jogo Atelier Marie (que agora terá remake e estará pela primeira vez disponível no Ocidente) e, desde então, conta com 23 jogos da saga principal (24 muito em breve) e com diversos spin off e versões melhoradas dos seus jogos. Apesar disso, a saga nunca teve um grande reconhecimento no ocidente, nem mesmo com alguns jogos de grande qualidade.
Como fã de longa data da saga, cada nova entrega enche-me de alegria. Alegria por voltar a navegar nestas experiências relaxantes mas profundas, passando por povoações inspiradas na cultura europeia do passado, escolas de alquimia, mundos em guerra e, incluso, cenários mais “fim do mundo” mantendo sempre a distinção que a caracteriza. Agora estamos numa ilha, num verão fogoso, onde o grito uivante por libertar-se do dia-a-dia paira dentro dos protagonistas.
Com a apresentação desta nova subsaga (Secret) a saga começou a ganhar atenção devido a algumas características da sua protagonista. Graças a isto contou com diversas fan-arts e word-of-mouth, o que permitiu ganhar novos seguidores e uma grande “excitação” em redor desta nova entrega, mesmo sem ter sido lançado no mercado. Deverá o jogo apenas se destacar pela sua protagonista, ou haverá algo mais que deva ser reconhecido? Lê a review para descobrires.
Nota: Em preparação para o lançamento de Atelier Ryza 3: Alchemist of the End & the Secret Key, iremos analisar tanto o jogo que aqui é apresentado como a sua seguinte parte.
História
Em Atelier Ryza: Ever Darkness and the Secret Hideout (Atelier Ryza para facilitar) seguimos os passos de Reisalin “Ryza” Stout e os seus amigos, Lent e Tao. Este grupo quer aventurar-se para além da sua ilha (Kurken island), numa vontade gigante de saber o que existe mais além do que conhecem do seu dia-a-dia. A este grupinho juntar-se-á Klaudia, uma jovem solitária que viaja com o seu pai pelo mundo, e que acaba por conhecer e passar os seus dias com Ryza e companhia. Mais tarde, juntam-se Lyla e Empel, ensinando este último, o poder da Alquimia a Ryza e, com isto, todo um novo mundo de possibilidades e experiências.
É uma história sobre um verão muito especial, um coming of age para este grupo. Além dos amigos descobrirem do que são capazes e quais os sonhos que desejam perseguir, começam a entender certos segredos que envolvem a sua ilha e as terras em seu redor.
A saga Atelier não se costuma destacar pela história de salvar o mundo, mas sim no dia-a-dia dos protagonistas e em problemas mais pessoais que eles enfrentam. Nesta entrega envolve, também, algo de certa urgência que poderá ter repercussões mais além da protagonista. Segue muito o estilo slice of life, em que ao avançar a história também vai havendo mais momentos secundários, dos protagonistas vivendo o seu dia a dia. Nas horas iniciais esta pode tender para a monotonia, não há muito a acontecer e ao também os elementos jogáveis serem introduzidos pouco a pouco pode acabar rompendo este ritmo de jogo inicial.
Todos os 6 protagonistas são carismáticos, tendo os 4 amigos uma boa evolução no decorrer do jogo. Cada um tem as suas preocupações, desejos e objetivos e todos lutarão para o conseguir. O Lent a busca do que significa ser forte, ultrapassando a relação com o seu pai, o Tao continuar a adquirir conhecimento e investigar as ruínas e lendas das antigas civilizações, a Klaudia fazer amigos e perceber o caminho que deve seguir. A nossa protagonista Ryza, desde cedo que cativou os fãs com os seus atributos estéticos, mas a personagem resultou muito mais que isso. Uma rapariga meio “maria rapaz” que está aborrecida da sua vida monótona ajudando os seus pais na quinta e que, com a sua boa disposição e caráter travesso, a tornam alguém que se destaca no geral (para bem e mal).
A história principal tem uma duração de uma 30 horas, podendo aumentar se resolvermos fazer todos os objetivos adicionais e as receitas de alquimia.
Visuais
A saga nunca se destacou por uns gráficos de topo, mas sim por um fantástico desenho artístico. Em Ryza tivemos uma boa evolução na parte gráfica, destacando a iluminação e um pouco as texturas que tiveram uma melhoria. No desenho artístico continua a apresentar a qualidade habitual, tudo muito colorido, com desenhos lindos, personagens com um estilo único e perfeitamente adaptados ao 3d. O mesmo se aplica aos monstros. Existe certa repetição no modelado de alguns npcs e monstros.
Os cenários do jogo são diversificados, não muito extensos, mas com alguma quantidade. Temos desde a ilha dos protagonistas de campos de trigo e praias e com a sua idílica aldeia, a planícies, florestas crepusculares, torres, cavernas, vulcões, castelos abandonados, e “mundos” paralelos, etc.
As animações dos personagens é um ponto que a saga necessita melhorar, sendo sempre muito robóticos e repetindo-se muitas vezes. Atelier Ryza é uma evolução no caminho certo, aumentado a fluidez destas, notando-se menos repetição nas animações.
O jogo tem um desempenho a 30fps estável, mesmo na versão da Nintendo Switch, que unido a uma bela paleta de cores e ambientação no geral, cria um jogo muito bonito (e sem dúvida dos RPGs mais bonitos da Switch).
Jogabilidade
A saga tem-nos habituado a constantes mudanças nos elementos do sistema de alquimia e de batalha, mas mantendo sempre o já tão clássico sistema por turnos. Ryza é talvez o maior ponto de distinção em muitos anos. Aqui estamos perante um sistema por turnos em tempo real. Escolhendo ações e realizando-as o tempo continua a passar, o que nos obriga a ser rápidos nas nossas escolhas. Além disso, apenas poderemos controlar um personagem. Podemos mudar quando quisermos entre eles em combate, inclusive dar ordens específicas (mas teremos de andar sempre a saltar de personagem a personagem e esperar que a ação se realize antes de mudar para outro, estando sempre o tempo a passar, sendo preferível estar focados apenas num).
Como fã de longa data, apanhei um valente choque durante as primeiras horas de jogo até me habituar. Quanto mais tempo o joguei, mais gostei deste sistema, torna-se muito dinâmico, e com alguma profundidade, apesar de perder um pouco de opções que outros da saga possuem
Ao tocar num inimigo visível em campo iniciará o combate (caso o ataquemos antes, ganhamos vantagem ao entrar em combate). Neste, teremos 3 personagens. Cada botão está associado a uma ação (Attack, Skill, Item, Move). À esquerda teremos a barra de ações com os retratos dos diversos personagens e inimigos em constante movimento, quando chegam ao ponto de ação, podem realizar ações. Cada ataque normal que fizermos fará ganhar um ponto AP (e usar skills fará diminuir) que, ao chegar a certa quantidade, permitirá subir o tactics level. Este tactics level permite realizar mais ataques normais, ter skills mais potentes e, ao chegar ao nível final, realizar um ataque muito poderoso se assim o desejarmos.
Por vezes os nossos companheiros que não controlamos em combate pedirão para realizarmos certas ações (action order) e, se o fizermos, fará com que eles consigam fazer um ataque especial. Também poderemos usar os objetos equipados, estes não se esgotam, estando ligados a um atributo, o CC, que permite utilizar certa quantidade e que se renovará ao voltar ao Atelier ou ao usar outros objetos. Podemos colocar os personagens na retaguarda ou vanguarda, dependendo do seu estilo e da nossa estratégia. Os personagens têm habilidades ativas e passivas em combate, sendo muito importante completar quests para obtermos mais (além de subir de nível). Podemos equipar os personagens com armas, armaduras e acessórios. Além disso, os objetos a usar em batalha, são equipados individualmente, havendo personagens que conseguem usar mais e melhores objetos.
Devo dizer que nos encontros normais o combate não se desenvolve muito, mas nas boss battle, onde podemos utilizar tudo o que temos à disposição, fará este sistema brilhar, mas brilhar com luz própria.
Fora do combate, a saga encanta pela sua abordagem única através da alquimia. E o que é esta alquimia? Pois consiste no processo de misturar diversos ingredientes para obter os mais heterogéneos tipos de objetos/armas (entre outros) como resultado.
Ora no Atelier da protagonista Ryza, é onde poderemos realizar esta alquimia num caldeirão com as receitas que teremos aprendido previamente. É uma sensação/forma de jogo diferente, ter que aprender a receita, ter os materiais, ter que escolher os melhores e como combiná-los e que habilidades aprender e deixar de lado. A verdade é que ao descrever desta forma pode não soar muito divertido, mas asseguro-vos, é viciante.
Além da alquimia tradicional, poderemos no Atelier fortalecer items e armas/armaduras, duplicar objetos, aventurar em mundos da nossa criação para obter objetos raros, plantar diversos tipos de sementes, criar um puni (um monstro gelatinoso já clássico da saga), etc. Incluso podem decorar o Atelier.
Existem diversas quest, algumas relacionadas com eventos secundários dos nossos protagonistas, outras com NPCs de Kurken Island e outras que requerem realizar certo tipos de ações dentro e fora do combate, para desbloquear melhorias para a equipa.
Existem Gathering tools que permitem recolher diversos tipos de objetos no terreno. Teremos, por exemplo, um machado, cana de pesca, ceifa, etc. Incluso num mesmo elemento do cenário é possível utilizar diferentes gathering tools, pelo que teremos muito que explorar e experimentar. Também, dependendo da qualidade das nossas tools, mais objetos e qualidade teremos à disposição.
Desbloqueamos também um fast travel que nos permitirá viajar instantaneamente para diversos locais, o que facilitará a recolha de objetos e realização de quests.
Se for este o vosso primeiro Atelier, pode ser um pouco pesado de assimilar, mas vai valer a pena.
Som
Gust é sinónimo de muita qualidade nas bandas sonoras e, novamente, não desaponta. A música complementa cada cena perfeitamente. Para mim, divide-se em músicas calmas/tranquilas e aquelas super animadas/extravagantes quando estamos em combate ou quando a veia aventureira do nosso grupo dá de si.
Adoro o uso das orquestrações ao longo do jogo e, especialmente, do uso da flauta, inclusive nos fantásticos temas de batalha.
Não posso esquecer a primeira luta contra um verdadeiro boss, a luta em si já era espetacular, mas, de repente, oiço a música “Southern White Wind” e todo o meu corpo arrepiou-se, ainda mais quando a música ganha mais e mais força, das melhores memórias recentes que tenho a este nível nos videojogos.
Como também é tradicional da saga, conta com alguns temas cantados, destacando o ending theme “Crocus” que, juntamente às imagens finais, são a perfeição de como acabar um jogo (espero que isto vos motive mesmo a jogar e acabar).
Tenho que admitir que apesar da qualidade se ter mantido, acho que a quantidade total de músicas reduziu-se em comparação a entregas passadas. Passou de muita qualidade e quantidade para apenas qualidade.
Voice Acting
O jogo apenas apresenta vozes apenas em japonês. Para mim, continua a ser muito desapontante a saga continuar a abandonar as vozes em inglês que tanto me ajudaram a apaixonar-me por este universo que a Gust criou. As vozes são de grande qualidade, retratando o seu nível emocional muito bem, sem exageros típicos que estas dobragens costumam apresentar.
Contudo, tenho que mencionar que o jogo não foi totalmente dobrado. Por norma, a saga Atelier costuma dobrar tudo, tanto história principal como eventos secundários, mas não é o caso em Ryza. Os momentos secundários ficaram só com texto. Isto torna-se ainda mais evidente devido a haver muitas cenas importantes na caracterização e crescimento dos protagonistas nestas cenas e perde muito impacto. Fica ainda mais difícil de aceitar tendo em conta que o volume destas cenas secundárias são menores aos anteriores jogos.
Atelier Ryza: Ever Darkness & the Secret Hideout está disponível para PlayStation 4, Nintendo Switch e PC.