Sê bem-vindo a Biomutant! Um RPG de acção em mundo aberto, que arrebatou muitos corações com a sua revelação no Verão de 2017. Dizia a Experiment 101 na altura, que o desenvolvimento do jogo já ia de vento em poupa, mas a verdade é que após a aquisição do estúdio por parte da THQ Nordic, pouco nos fomos lembrando da existência do mesmo ao longo dos últimos anos… Eis então que chega 2021 e nos traz a boa notícia da chegada do seu lançamento para 25 de Maio!
E agora, depois de imensas semanas de exploração num dos jogos onde me abstraí do facto de estar a jogar para fazer uma análise, e depois dos imensos problemas que surgiram no seu lançamento atribulado estarem maioritariamente corrigidos, chega o momento de olhar para esta pequena equipa de desenvolvimento, de apenas umas dezenas de elementos, e atestar o produto que criaram.
Uma mutação de ideias
Para começar, temos imensas opções de costumização do nosso personagem que nos permitem não só fazer escolhas do ponto de vista visual, mas também do tipo de atributos, classe ou espécie de animal. Um sistema algo satisfatório, que nos deixa logo a perceber o leque de conceitos que podemos antecipar para este jogo e, que nos coloca logo na corrida pela nossa sobrevivência.
Falemos dos conceitos aqui explorados antes de mais. Biomutant bebe de um turbilhão de ideias. Seja a história com finais alternativos que dependem das tuas escolhas tanto a nível de diálogos como de acções, seja a mensagem pro-ambiental e o grito de aviso à humanidade, seja uma série de mecânicas de combate, de skill tree, de customização, de novos tipos de puzzles que surgem do nada, como se a mecânica tivesse sido só desenhada para aquele específico achado, sejam os diferentes tipos de veículos e montadas… parece que estás sempre a descobrir algo novo no jogo, por mais que te aproximes do fim.
No meio de tanto, sinto que houve toda uma sessão de brainstorm de ideias em que, depois de muito se debater, parece que todos concordaram em incluir tudo. Temos então como resultado uma série de detalhes e ramificações de ideias postas em prática de uma forma até algo sólida e competente, dado o tamanho da equipa de developers a trabalhar neste título. No entanto, Biomutant não vinga, e porquê? Porque se sente que praticamente tudo neste jogo foi apressado para ser concluído.
Um enredo que poderia ver melhores dias
Apesar da frescura da descoberta, da liberdade e do divertimento que este mundo me proporcionou, senti para começar, que a história que o suporta é um pouco superficial demais, em relação ao que dá a entender que nos quer contar. Indo mais ao fulcro da questão, senti este jogo severamente penalizado pelos seus diálogos mal trabalhados, pouco incisivos, e algo indiferentes quase às nossas escolhas. Na maioria das vezes em que tive a oportunidade de perguntar algo a um NPC, senti imenso que as falas fugiam um pouco à questão e não traziam respostas. Tanto que fiquei totalmente indiferente ao que eles enrolavam e dava por mim só a seguir as indicações da Quest no UI.
A história em si até nos proporciona um bom ponto de partida para este mundo, mas sinto a falta de suporte, sobretudo para explorar melhor o fulcro desta crise ambiental e da sua mensagem. É como se nunca pensassem que este planeta teria uma segunda oportunidade, e portanto somos apressados a seguir em frente sem percebermos claramente como chegámos até onde chegámos. Mas isto é mais referente ao pano de fundo que nos segue, pois o enredo principal sente-se ainda mais básico, como que um esboço de algo ainda por ser. Este é tão pobre que o pouco que nos é revelado sobre as tragédias que deram origem àquele mundo, em pequenas interacções com objectos que encontramos no mundo aberto, parecem ter sido trabalhadas com maior dedicação.
No fundo do fundo, o jogo é algo tendencioso a que faças as escolhas certas, e que pendas para uma aura de luz e não de escuridão, sendo este sistema de karma o guia desta história. Sim, mais uma mecânica em jogo, onde tens um anjo e um demónio a darem palpites sobre as tuas escolhas. Regressando à história, Biomutant quer que faças as escolhas e te despaches a completar as Quest principais que te levam a unificar as tribos, e a salvar a grande árvore que suporta a vida, bem como a enfrentares um velho inimigo. No entanto, tens ao teu redor uma boa quantidade de sidequests que te dão uma melhor sensação de preenchimento e abstracção, se estiveres apenas com vontade de desanuviar e explorar.
Mas bem, chega de bater no ceguinho, neste tópico quero apenas contrapor que é surpreendente que apesar da quantidade de diálogos insípidos ser imensa, temos sempre presente connosco um narrador infalível, que nos traduz tudo o que é dito na estranha língua das criaturas deste planeta. A sério, David Shaw Parker fez aqui um trabalho monumental, narrando toda e qualquer fala, que no entanto devido à fraca escrita dos diálogos, torna-se entediante e por vezes até irritante. O mesmo também vai falando connosco de vez em quando conforme vamos explorando o mundo, e reforça a necessidade de nos apressarmos para as Quest principais. É uma companhia constante para o jogador, e até seria engraçado se pensássemos nele como a voz do grilo que carregamos connosco, acho que a ideia do grilo falante não esteve no brainstorm da Experiment 101.
Neste mundo há sempre algo surpreendente a descobrir a cada 5 minutos
Pondo o enredo de parte, temos então um mundo inteiro por explorar, onde se há coisa que não conseguimos, é ficar entediados! Este é populado por diferentes zonas infectadas com diversos tipos de contaminação, a que vamos ganhando imunidade conforme progredimos, mas que ainda assim, dificilmente atravessamos sem começarmos a perder vida. Temos também diferentes tipos de estruturas que podemos encontrar e pilhar, que vão desde a pequenas cidades em ruínas, a vilas, a velhas estações de comboios, grutas e estações subterrâneas, santuários, cais, fortes das tribos… Enfim é impossível andares perdido por 5 minutos e não encontrares nada de interessante para explorar. A maioria destes locais, incentiva-te ao loot, pois surge-te uma lista no UI com uma série de dicas de itens que podes encontrar nesse espaço.
Se há coisa em que fui obsessiva neste jogo, foi com o loot, pois este tanto te pode trazer novos equipamentos e partes de armas, com diferentes raridades e níveis de atributos, como comida, injecção de vida e de energia, entre outras coisas. Este loot pode ser feito tanto a abrir caixas, como a escavar lixo, ou ainda, a vasculhar os pertences dos inimigos caídos, mas devo dizer que em grande parte não me serviu para nada. Aqui tens cerca de 4 opções do que podes fazer com os itens que encontras: 1 Equipas no caso de equipamentos de vestuário, ou fazes Craft e crias a tua própria arma no caso das partes de armamento; 2 fazes melhoramentos do que já tens; 3 fazes upcycling (um conceito muito explorado neste jogo e que reforça a mensagem ambiental mas não o suficiente) e ficas com matérias primas como metal, madeira, etc; 4 vendes. Neste último, devo dizer que praticamente não precisei de comprar nada nas lojas, nem a vendedores espalhados pelo mapa, pelo que o dinheiro do jogo foi completamente inútil no meu caso.
Uma coisa é certa, assim que apanhas um equipamento lendário com os status mais elevados que tens até ao momento, és bem capaz de te ficar por aí. Aprimoras esse equipamento e dificilmente encontrarás algo que seja melhor. Portanto o loot posterior é em grande parte para te desfazeres.
Em termos de população, o mundo de Biomutant também te mantém ocupado com uma boa diversidade de inimigos de todo o tipo, espécie e tamanho, que vais encontrando também a cada 5 minutos de exploração. Podes tanto encontrar pequenos esconderijos, como fortes, ou ninhos, ou apenas um grupo a deambular pelas ruas, ou ainda um mini boss no meio da vegetação. Os principais inimigos são contudo os 4 devoradores que ameaçam destruir a árvore da vida, as tribos rivais, o teu arqui-inimigo Lula-Lupin, e uns monstros gigantescos que irás encontrar algures no mapa a defrontarem a tua tribo.
Em termos de deslocação achei engraçado que se tivessem lembrado de que a personagem principal tem de “marcar” os devidos pontos de fast-travel, fazendo as suas necessidades fisiológicas, como um verdadeiro animal que marca o seu território. De outra forma, podes deslocar-te por corrida a quatro patas, de montada a todo o terreno, planar sobre descidas íngremes, nadar, ou conduzir veículos que vão desde um mecha a uma espécie de scooter de água e até fazer scooba diving. Parece que as ideias nunca pararam de fluir e a Experiment 101 foi implementando tudo e mais alguma coisa que lhe aparecia à frente…
Uma boa diversidade de habilidades de combate
Em termos de habilidades, temos uma mão cheia de diferentes skills, que conferem melhoramentos à nossa personagem, para além das referentes aos próprios atributos de inteligência, força e agilidade, que podemos melhorar a cada nível conquistado. Fora essas, tens diversas habilidades focadas no combate e que podem ser desbloqueadas com diferentes tipos de pontos. Alguns desses exemplos são os pontos que adquires derrotado inimigos, que só podem ser investidos em habilidades de combate. Muito do combate corpo a corpo aqui explorado tem por base uma arte marcial chamada Wung-Fu, cujos movimentos vais desbloqueando, com o mesmo tipo de pontos que podes utilizar nas habilidades com as armas, e que se dividem em subcategorias dependendo do teu estilo de luta preferido (duas espadas por exemplo é o meu).
Além disto, temos Psi-points que só são adquiridos ao acendermos santuários ou ao ajudarmos alguém em apuros. Estes conferem-nos poderes psíquicos que nos permitem levitar, esquivar, fazer ataques com fogo, gelo, etc… Mas não nos ficamos por aqui. Temos também os Bio-points que só poderão ser encontrados ao abrirmos bio contentores. Estes pontos podem ser investidos em habilidades que se aproveitam dos diferentes tipos de contaminações existentes. Por fim temos também as resistências a quatro dos cinco tipos de contaminações existentes, fogo, gelo, radioatividade e biohazard, para além da hypoxia.
Estas habilidades permitem-te utilizar um menu de ataques especiais que podes mapear a teu gosto, e aos quais podes aceder premindo apenas um par de botões. De facto, no que toca a controlos, achei o mapa de botões muito bem atribuído e intuitivo, dada a quantidade de habilidades a desbloquear e ao facto de eu normalmente procurar evitar jogos onde as skill trees sejam muito complexas, pois rpgs muito complexos não são a minha praia, mas até que dei bem conta do recado com este jogo.
Um mundo vivo mas a que falta polimento
Em termos gráficos, o mundo de Biomutant sente-se vivo, pulsante, com cores saturadíssimas e vibrantes, o que sempre agrada bastante aos nossos olhos e nos permite deslumbrar paisagens lindíssimas de nos faltar o ar. No entanto em termos de UI, parece que não temos uma identidade visual definida. De facto, tanto os menus dos mapas, como o menu principal, e os sub menu onde exploramos as habilidades, o crafting e os melhoramentos da personagem, não têm nada a ver visualmente.
Já em termos de animação, sinto que principalmente a animação do duplo salto tem uma tensão que não deveria existir e, a animação do ciclo de corrida sente-se estranha e não totalmente bem executada. No entanto no que toca a cinemáticas, estas estão a outro nível, de tão má que é a execução, infelizmente.
Na sonoridade, Biomutant possui uma banda sonora inspirada no épico e com uma veia de música tradicional japonesa que me agrada bastante. Já em termos de efeitos sonoros, estes parecem ser muito limitados e sem grande qualidade de execução.
A acrescentar, tenho ainda, que estive a desenvovler esta análise jogando tanto na PlayStation 4 como na PlayStation 5 e, em ambas encontrei freeze frames que embora na PS5 tenham sido muito mais raros e curtos, na PlayStation 4 por vezes faziam ranger os dentes.
Biomutant já está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S, e na Steam para PC.