A  KEMCO, empresa editora e também ocasional desenvolvedora de videojogos estabelecida em 1984, é amplamente conhecida na comunidade pelos seus jogos no estilo RPG Maker. Infelizmente, para mal dos seus pecados, o que se diz na gíria revela muita verdade: os títulos publicados são, em larga parte, medianos e vulgarmente comuns; experiências by the book, como dita a famosa expressão inglesa. Ainda assim volta e meia surge uma pequena pérola do cardápio: Raging Loop, uma Visual Novel de terror, foi uma dessas alegres surpresas. Blacksmith of the Sand Kingdom, desenvolvido pela Rideon, Inc. surpreende pela sua tentativa em misturar géneros diferentes, conseguindo ser algo divertido até ao correr dos créditos finais.

Na nação desértica e selvagem de Muspelheim, também conhecida como “the Sand Kingdom” (ou o Reino da Areia) o estado das coisas encontra-se relativamente calmo até que, certo dia, um rapaz domiciliado em Santburg toma a decisão de dar um rumo diferente à sua vida. Volker (ou outro nome à escolha) sempre desejou ser um aventureiro, mas as responsabilidades do seu pai Ulrich, recentemente falecido ferreiro apontado pela corte, pesam na sua consciência. No entanto, convencido pela sua amiga de infância Valeria, em conjunto com a fada Pitte, Volker decide albergar ambas as profissões: aventureiro e ferreiro em simultâneo, perseguindo os seus sonhos e rejuvenescendo a loja que herdou do pai denominada The Iron Bird.

O enredo não irá conquistar prémios, mas é suficiente para complementar a jogabilidade. Blacksmith of the Sand Kingdom, como tanto outro publicado pela KEMCO, tem um enredo simples e elementar; os clichês estão todos lá assim como os arquétipos nas personagens: Horick, por exemplo, é o dono da loja de itens genéricos, mas um típico génio preguiçoso com uma atitude meio arrogante. Kristoff é gentil e muito calmo. Ele preenche o lugar de padre e gerente da enfermaria, no entanto corre o rumor que se revela muito assustador quando está zangado; atenção que a história e suas personagens não são propriamente desagradáveis, mas do início ao fim tudo é tão mediocremente previsível que serve apenas como verbo de encher. No entanto, destaca-se muito positivamente as ilustrações de todas as personagens; são surpreendentemente encantadoras.

Menos previsível foi a jogabilidade, pois conhecendo o reportório da KEMCO esperava novamente mais uma empreitada típica de RPG Maker, mas felizmente não foi esse o caso. Para minha surpresa a primeira coisa que veio à cabeça, quando tudo começou a fazer sentido, foi Mana Khemia: Alchemists of Al-Revis, um clássico RPG da GUST com um foco em alquimia na clássica PlayStation 2. Apesar de não ser tão bom quanto a sua comparação, o fluxo da jogabilidade de Blacksmith of the Sand Kingdom é muito semelhante: Em primeira instância aventura-se por uma masmorra, regra geral a mando da Guilda dos Aventureiros a troco de dinheiro e itens por uma tarefa bem sucedida. Posteriormente iniciam-se os trabalhos de um ferreiro.

Concluída uma demanda, Volker, com a ajuda de Valeria e Pitte, trabalha na loja The Iron Bird transformando materiais adquiridos durante o dia em armamento como adagas, catanas, capacetes, e tantos outros que, por sua vez, podem ser comercializadas no final do dia ou utilizadas para melhor equipar o nosso grupo de aventureiros. Confesso que rapidamente o ciclo vicia, desejando sempre receber mais materiais durante a exploração a troco de criar armamento sucessivamente mais forte. Para incentivar este ciclo todos os objetos podem atingir uma certa percentagem, seja utilização frequente em batalha ou por um processo de criação desenfreada. Quando um item atinge 100% dessa percentagem desbloqueia uma nova receita, melhora as estatísticas do equipamento ou até ambos.

A representar a outra fatia da jogabilidade está o combate e exploração ocorridos durante a travessia por uma masmorra. No entanto, antes de iniciar tal façanha é necessário estabelecer uma equipa com mais quatro aventureiros, todos personalizáveis. Aqui encontra-se o mais profundo e dinâmico sistema em Blacksmith of the Sand Kingdom. Com um cardápio de catorze profissões disponíveis até ao final do título, mais a capacidade de atribuir uma segunda profissão a partir de nível dez, as combinações podem ser bastante interessantes e vantajosas. Por exemplo: a profissão Knight é adepta em capturar a atenção do inimigo, absorvendo dano graças ao seu gigante reservatório de pontos de vida e muitos pontos inerentes à defesa. Por sua vez a profissão Priest dispõe de um reservatório elevado de pontos de magia e vida. Misturem os dois e a receita para um tanque que cura está concluída!

Além de uma profissão, cada personagem pode ter um total de seis habilidades passivas em simultâneo como, por exemplo, Knife Mastery ou Offensive Magic Up. Junta-se a isto a possibilidade de distribuir a equipa em certas formações dispondo, por exemplo, dos membros mais frágeis na retaguarda. Por último, cada personagem pode escolher acreditar numa divindade em particular, conferindo-lhe vários aumentos estatísticos passivos. Ainda assim, apesar das combinações serem mais do que muitas, após trinta horas de ‘ferreirices’ confirma-se que o equilíbrio equitativo não existe entre as várias combinações onde, na reta final da aventura e até post-game, a magia, armadura pesada e algumas profissões perdem valor, sendo mais valorizados os pontos depositados em ATK (ataque físico), AGI (agilidade), EVA (evasion) e LUC (luck) ou cargos como Samurai e Sage.

O combate propriamente dito segue a linha de um clássico RPG por turnos, esses ditados pela personagem com mais pontos em AGI e por aí sucessivamente. Tudo o resto acompanha os mesmos moldes com a exceção das formações anteriormente referidas; esta mecânica obriga a um pensamento mais estratégico para calcular a distribuição da equipa no campo de batalha. A destacar pela positiva, um pouco devido à natureza repetitiva dos encontros, é conseguir acelerar o ritmo da batalha e configurar um modo piloto automático, este favorecendo a utilização de habilidades mais ofensivas ou defensivas mediante escolha nossa, por exemplo.

Blacksmith of the Sand Kingdom é um título com bom desempenho na Xbox Series S. Não que isso fosse um espanto tendo em consideração todos os aspetos que o compõem, mas é sempre satisfatório poder afirmar que nunca ocorreu um bug peculiar ou uma queda específica de fotogramas. Surpreendente foi, no entanto, a funcionalidade Quick Resume estar disponível. Entre pausas de sessões de jogo soube bem conseguir voltar logo à aventura embora, para ser perfeitamente honesto, o título permita salvar o progresso em qualquer instância (exceto combate).

Blacksmith of the Sand Kingdom já se encontra disponível para as plataformas Nintendo Switch, PlayStation 4, Xbox One, Android, Steam, iOS, Xbox Series S|X

CONCLUSÃO
Razoável
6
Ulisses Domingues
Desde muito cedo um confesso apaixonado pelos mundos da PlayStation e consolas Nintendo. No entanto a vida dá muitas voltas e agora o seu amor foca-se nas novas Xbox Series. Nada como paixão à primeira vista, não é verdade?
blacksmith-of-the-sand-kingdom-analiseComo se costuma dizer em bom português “este não é lá grande espingarda”. No entanto Blacksmith of the Sand Kingdom consegue ser um título decente. É de caras que a narrativa podia ser muito melhor, que a banda sonora fosse mais do que aceitável e que o combate fosse um pouco mais equilibrado, mas não é um título para esquecer completamente. O ciclo entre produzir itens e voltar à exploração para adquirir mais materiais é viciante, e o estilo artístico empregue é muito cativante; simples e by the book. É a receita KEMCO.