Em 1986, o mundo tremeu com o acidente nuclear mais desastroso da nossa história. Durante um teste de segurança, sucedeu-se uma grave combinação de falhas que originou uma forte explosão num dos reatores, mais precisamente o reator número 4, libertando assim uma nuvem radioativa que se espalhou na atmosfera, assombrando a União Soviética e um pouco por todo o mundo com fortes impactos na saúde, segurança e economia.

É neste contexto assombroso que se passa Chernobylite, 30 anos depois do acidente. Este, é um título indie bastante ambicioso, desenvolvido pelo estúdio Polonês: The Farm 51. A sua proposta, é na verdade uma mescla de estilos e géneros à mistura: Survival horror, ação, e um RPG com uma elaborada gestão de uma equipa como um todo, de recursos essenciais para sobrevivência e evolução, peças chave para uma missão bem-sucedida.

Em busca do amor incondicional

Controlamos o cientista e físico Igor (não sou eu), que 30 anos após o grave incidente, parte em busca da sua esposa Tatyana (não, seguramente não sou eu) desaparecida desde o acidente. O nosso protagonista tem um background bastante curioso, já que era um dos funcionários da usina nuclear em questão, e conhece bem os cantos, e especialmente os segredos e medidas de toda uma organização soviética. Este, no entanto, não é propriamente o Chernobyl e todas as suas consequências resultantes que conhecemos, mas muito mais do que isso. Neste universo criado pela Farm 51, existe uma substância extremamente valiosa – com um poder capaz de criar criaturas sobrenaturais -, o minério que dá nome ao jogo: Chernobylite. Este minério alimenta-se um pouco por toda a cidade de Pripyat e é uma matéria já há muito estudada e trabalhada pelo nosso protagonista, que a usará a todo o custo na sua incessante busca pela sua amada.

A narrativa principal que alimenta o foco da verdadeira de missão de Igor em Chernobylite, é também acompanhada por bastantes missões secundárias, que dão a conhecer um pouco mais do passado daquele local, e de algumas personagens misteriosas que vamos conhecendo pelo caminho. Algumas destas personagens podem ser recrutadas para juntar à base, que nos é apresentada nas primeiras horas de jogo, que bem ao estilo da série Fallout pode ser aproveitada não só de forma estética, como também na finalidade de criar construções de infraestruturas que nos facilitarão a jornada dos personagens, como fabricação de munições, melhoramentos e criação de armas e até aumento da moral dos seus residentes, algo importante para garantir estabilidade da equipa e as relações entre si entre as missões.

Tatyana, e o seu charme hipnotizante

A aventura por Pripyat

Se já jogaste algum título da série Metro ou Fallout, será fácil de te ambientares por aqui. As semelhanças são imensas e claramente tiveram influência no estúdio Polonês. O ambiente claustrofóbico de Metro encontra-se presente, além dos altos níveis de radiação capaz de levar o jogador à loucura. Já a maior semelhança com Fallout, passa pela construção da base com recursos e sucata recolhida durante as missões. A grande diferença e que caracteriza muito bem Chernobylite acontece nos ciclos diários. As missões são passadas durante o dia, e após a finalização das mesmas, voltarás à base e ficará de noite, e será aí que poderás elaborar as construções e upgrades necessários, e logo de seguida dormir, para refrescar as tuas stats, e te preparares para um outro novo dia. Após as missões, terás que tomar algumas decisões que podem dificultar quando tens uma base bem populada, isto é, se irás abdicar de ração de combate para uns em prol de outros, e assim sucessivamente. Um dos conceitos mais interessantes deste jogo passa pela tua liderança, já que podes enviar os habitantes da base para missões a solo; e algumas dessas com enormes percentagem de falha e até morte.

A jogabilidade é no geral bastante metódica e contida. Como será fácil de imaginar, Pripyat não é propriamente um mar de recursos, e portanto tudo terá que ser gerido com o máximo cuidado. Por vezes, evitar o combate será o melhor remédio, não só para poupar munição, mas também para manter a sanidade mental de Igor intacta, que irá diminuindo à maneira que elimines fatalmente algum inimigo, ou fiques exposto durante muito tempo a extremos níveis de radiação. O combate com armas de fogo não é de todo brilhante, muito provavelmente de forma propositada pelo estúdio; quase que te obrigando a optar pela jornada mais furtiva e dificultada, e trazendo à tona a realidade do qual Igor se enquadra, já que é um ex-funcionário de uma usina, e não propriamente um soldado.

Este semi open-world é pequeno no seu modelo geral, mas variado em detalhes de cada uma das cinco áreas do jogo, com diversos esconderijos espalhados, possível uso de camuflagem para uma abordagem mais silenciosa, e um vasto leque de armas e armaduras ao dispor, como um bom rpg à moda antiga. Algo a destacar são os pontos de interrogação espalhados pelo mapa, que são muito convidativos a serem explorados. Cada um destes locais leva-nos a descobertas únicas, e algumas bastante peculiares e cómicas com personagens no mínimo, curiosas…

No meio do desolamento, há tempo para comédia com lootboxes

Ambiente sonoro que torna tudo mais especial

Chernobylite não é só coisas boas, um dos maiores exemplos disso foi vivenciada logo na minha primeira experiência com uma das criaturas sobrenaturais, um momento que deveria ter sido empolgante, e ficou completamente marcado pela indiferença, já que o pobre desgraçado ficou com metade do seu corpo dentro de uma das paredes de uma habitação, ou restos dela. Com uma visibilidade escassa, lá consegui colocar o cano da caçadeira colado à parede, e eliminar a criatura. De toda a experiência durante as minhas 25 horas de jogo, esse foi o único bug que afetou diretamente a experiência. Aconteceram alguns pequenos glitches com os itens, e umas poucas abruptas quedas na qualidade gráfica em pormenores menos texturizados, mas tendo em conta os tamanhos das áreas e a amplitude de exploração, é normal acontecer por vezes alguma destas situações, tendo em conta que a Farm 51 não é um enorme estúdio. Será naturalmente algo a corrigir pelos desenvolvedores, tal como têm feito assim que estes bugs são reportados nas suas páginas oficiais, ou do Reddit.

Uma nota especial também a todo o trabalho sonoro presente neste título, que é uma gigante ajuda a convidar o jogador a ambientar-se neste mundo quase apocalíptico. A dobragem em Russo (opcional) é surpreendentemente boa, com alguns personagens com trabalhos de voz realmente caprichados. A música ambiente calma e melancólica que nos persegue enquanto exploramos a zona de Pripyat é brilhante, e encaixa perfeitamente naquela cidade assombrada por um desastroso passado que o mundo não deve esquecer.

A versão utilizada para o uso desta análise, foi a edição de Playstation 5, lançada mais de meio ano depois das versões de geração passada! Esta, ou a versão Xbox Series X, são a experiência definitiva naquilo que é jogar em consolas. A queda de quadros que era algo constante, é agora praticamente nula, com extremas melhorias na iluminação, texturas, sombras e vegetação, opção de 60 fps, ray tracing, e com notória implementação das funcionalidades no uso do dualsense, neste caso para usuários da PS5. O meu colega Diogo Lopes fez a sua crítica do jogo da versão passada, e podes fazer as tuas comparações das versões ao ler o artigo dele, aqui!

CONCLUSÃO
Muito bom
8.5
Igor Gonçalves
Curioso, explorador, e fã de videojogos desde que me lembro, e em especial pela saga Metal Gear. Não jogo plataformas, jogo jogos.
chernobylite-analise-nova-geracaoChernobylite é um jogo excepcional, desenvolvido por um estúdio de orçamento pequeno; mas cheio de garra e paixão. Se és fã de jogos desafiantes de sobrevivência e gestão, tens aqui a dose certa para aproveitares imensas horas de diversão, naquela que é a representação mais digna em videojogo do enorme acidente de Chernobyl.