Nem todos os jogos survival horror precisam da temática paranormal para serem bem sucedidos. Conscript é a prova disso, num tema pesado de um dos acontecimentos mais terroríficos da nossa história. A Primeira Guerra Mundial, com as suas trincheiras lamacentas e armas químicas como o gás cloro, deixou milhões de mortos, e uma marca perdurável de horror na história, e é neste tópico narrativo e atmosférico que Conscript é enquadrado, dando a provar o sabor triste dos dias da grande guerra, mais particularmente da terrível batalha de Verdun.

Conscript é um jogo inspirado pelos clássicos que lideram o género. Existem os elementos de gestão de inventário como Resident Evil, que te obrigam a lidar com a escassez de recursos de forma a que evitar confrontos com inimigos possa ser vantajoso. Os puzzles que caracterizam o estilo também estão presentes, como a procura incessante por uma chave que te faça progredir, ou outra opcional que te garanta mais recursos e até armas únicas. E os três elementos-chave que compõem esta sopa: a sensação de isolamento, a constante ameaça e o desconhecido, estas juntas, criam uma atmosfera brilhante, e é este impasse que faz Conscript ser um título de terror psicológico intenso e delicioso.

A história do jogo gira em torno de um soldado francês que, após um ataque surpresa devastador, se vê separado da sua unidade, e o pior; numa busca desesperada pelo seu irmão que se encontra no frente da batalha. O lado humano está sempre muito presente nesta narrativa, e com uma atmosfera tensa e por vezes até claustrofóbica. Além do tema principal da narrativa ser extremamente desesperador, ainda existem extras para explorar por meios de diários, cartas e outros objetos encontrados ao longo do caminho, que oferecem pistas e relatos sobre os horrores da guerra.

Tudo isto é contado com grande apuro, e faz-nos crer a cada momento que a experiência do nosso protagonista podia ser qualquer um de nós, se nascêssemos no local e ano errado. Os cenários são ricos, mesmo em pixel art, com sons sempre opressivos, prontos a passar aquele frio na barriga de ansiedade constante. Transformando este pequeno resumo em poucas palavras, diria que é uma história assustadora precisamente por ser muito palpável e fácil de identificar.

Quanto à jogabilidade, apesar de já ter explicado um pouco dos fundamentos gerais, tentarei detalhar mais neste parágrafo. Reconheço que é chato estar constantemente a mencionar outros títulos e fazer comparações directas, mas com Conscript e Resident Evil é inevitável, até porque de forma geral, a malta conhece bem os elementos da sua jogabilidade.

O teu personagem conta com uma barra de vida já clássica do estilo, e pode sofrer ferimentos que afectará a sua capacidade de correr e combater. Isto, para te explicar que os famosos kits médicos e ligaduras encontram-se espalhados pelo mapa para te ajudar a recuperar o estado inicial. Voltando à gestão de recursos, é muito simples: munição, alimentos, ferramentas, armas e equipamento, todos estes recursos são geridos com os espaços de inventário limitados, e podes combinar alguns para melhor potência. Uma vez mais, Resident Evil em todo o seu esplendor.

Não só inimigos humanos nos dão luta; os malditos ratos são um dos grandes obstáculos do jogo, já que além de atacar violentamente e ferir o protagonista, criam infeção, e consequentemente mais recursos serão gastos. Esta praga assustadora pode ser controlada se não deixares que se reproduzem e acumulem nos assustadores túneis que ligam o esgoto ao solo.

Alguns detalhes podem ser encontrados no mapa quando exploras e procuras por recursos, como pósteres de recrutamento e outros com alusões à época vivida. Quando matas um soldado inimigo podes muitas vezes encontrar alguns pertences como uma lembrança da família, mostrando o lado humano dos dois lados, e o que é ser um peão da máquina de guerra governamental.

Conscript destaca-se também pelos seus gráficos e estilo artístico 16-bit, que, a meu ver, combina extremamente bem com a temática. A paleta de cores é escura e sem vida, com um tom melancólico que faz tudo ficar muito belo. A atenção ao detalhe é imensa e tudo fica mais completo com uma banda sonora e efeitos sonoros fantásticos. Uma vez mais, tal como Resident Evil (cá estou eu novamente), apenas na save room há tempo e espaço para reflectir, com um tema belo e melancólico, numa clara alusão à brilhante saga da Capcom.

CONCLUSÃO
A beleza na tristeza
9
Igor Gonçalves
Curioso, explorador, e fã de videojogos desde que me lembro, e em especial pela saga Metal Gear. Não jogo plataformas, jogo jogos.
conscript-analiseConscript é um belo jogo que captura de forma impressionante a atmosfera sombria e melancólica da Primeira Guerra Mundial. Com uma estética envolvente e uma narrativa envolta em tensão, o jogo consegue transmitir com precisão e de forma brilhante o horror e a desolação do conflito, tornando-o assim uma das minhas obras-primas de 2024.