Um dos meus primeiros momentos com o primeiro Dragon’s Dogma resume-se em ter saído para explorar o mundo, encontrar um ciclope, e testemunhar o meu pawn a escalar as costas do mesmo e atacar-lhe no olho com a sua espada. Este ataque fez com que o gigante ficasse desequilibrado, e, considerando que estávamos numa ravina, o ciclope, juntamente com o meu pawn que ainda se encontrava agarrado à cabeça do mesmo, caíram pela ravina abaixo. Para surpresa de ninguém, o ciclope foi derrotado, mas, no que toca ao meu pawn, o mesmo também não teve um destino muito saudável, acabando por morrer igualmente com a queda.

Momentos como estes fizeram de Dragon’s Dogma um dos meus jogos favoritos da geração da Playstation 3 e Xbox 360, sendo um jogo que deixou uma marca na minha vida de jogador como algo que simplesmente nunca esquecerei.

Ora que, mais de uma década depois, cá estou eu, e desta vez decidi ser eu a montar o gigante que, convenientemente, agarrou-se nas 2 pontas da ravina, criando uma ponte para a minha personagem e os pawns atravessarem para o outro lado. Infelizmente, os meus pawns decidiram pregar-me uma partida, e atacaram os pés do gigante, fazendo com que ele se desprendesse e caísse no rio que se encontrava em baixo, juntamente comigo. Este acontecimento seguiu-se de uma celebração dos meus pawns por termos derrotado o ciclope, sem qualquer preocupação com o bem-estar da minha personagem. Para os castigar, decidi então agarrar nos meus pawns um a um e atirá-los para o rio. Algo que, sendo sincero, foi bastante satisfatório.

Eis que vos apresento Dragon’s Dogma 2, a tão esperada sequela do fantástico Dragon’s Dogma. Um jogo que esperava há praticamente uma década, cuja revelação cómica envolvendo t-shirts com o logotipo e uma festa do Hideaki Itsuno me meteram num estado de completa euforia.

Uma pequena menção acerca da monetização

Antes de tudo, gostaria de mencionar que o jogo apresenta algumas micro transações, como poderes comprar um Portcrystal ou uma chave para sair da prisão, por exemplo. Estas micro transações são inúteis para a experiência do jogo, visto que arranjar tudo o que se encontra à venda é bastante fácil. Infelizmente, a existência das mesmas, na minha opinião, definem-se como um desperdício de recursos autêntico, juntamente com uma contradição do que o jogo representa. Apesar da inutilidade, não há justificação para a existência das mesmas, sendo que os recursos poderiam ter sido melhor gastos em algo como a optimização geral do jogo (que irei desenvolver um pouco mais à frente).

Um trono para reclamar

A premissa de Dragon’s Dogma 2 apresenta-se como uma bastante simples. Tu és um Arisen, um ser com poderes especiais, capaz de controlar pawns, uns humanoides que serviram como a tua party na aventura. O Arisen é considerado como o Sovran neste mundo, sendo praticamente um rei, com o seu trono e palácio. Ora que, quando chegamos à cidade, deparamo-nos com um rei falso, alguém que se está a representar-se como Arisen, mas que não o é, pois neste mundo apenas só pode existir um. O teu objetivo principal então é de recuperar o teu trono e o teu título como Sovran.

A história no primeiro jogo foi um ponto fraco, e, na sequela, temos uma situação semelhante. Apesar de apresentar algumas melhorias de coerência, narrativa e personagens. O conteúdo da mesma é praticamente uma desculpa para o jogador se preparar e aventurar pelo vasto mundo. Com isto, a história não se intromete, nem tende a apresentar momentos que sejam considerados maus, sendo apenas algo presente, mas não focal.

Uma tecnologia ambiciosa, um motor incapaz

Temos de volta o famoso RE Engine da Capcom, que veio estrear-se num mundo aberto. Graficamente, Dragon’s Dogma 2 tem uma apresentação sólida, com uma qualidade de texturas e modelos bastante altas e detalhadas. O uso de Ray Tracing Global Illumination também é bem vindo, com a iluminação a atingir uma consistência e naturalidade bastante avançada.

Infelizmente, nem tudo é um mar de rosas, e o jogo atinge os limites do motor com uma facilidade bastante significativa. Começando pelos NPCs, temos aqui uma situação onde é possível verificar os vários NPCs nas cidades a simplesmente materializarem-se no ecrã, havendo até situações onde os mesmos materializam-se após o jogador colidir com eles, quebrando por completo a imersão do mundo. Poderiam-se tratar de escolhas de optimização para manter um desempenho saudável, mas, mesmo com estas limitações, o motor mostra-se com dificuldades a manter um desempenho devido, havendo situações onde o jogo se encontra a menos de 30 fps, com vários soluços presentes. Estas situações são mais comuns nas cidades e nos combates com bastantes efeitos e partículas, fazendo com que haja uma sensação de que estamos a jogar um produto inacabado.

Mesmo com uma atualização que nos deixa desligar o ray tracing e impor um limite de 30 fps máximos, o jogo continua a não conseguir sequer chegar perto dos 60 fps, nem manter os 30 fps com um frame timing correto, fazendo com que a opção de 30 fps se apresente como uma opção basicamente inútil.

Apesar do desempenho não afetar a minha pontuação nas análises, o estado em que o jogo se encontra é, na minha opinião, inaceitável, e de momento não recomendo a compra do jogo até o mesmo se encontrar devidamente arranjado.

O melhor está na viagem, não no objetivo

Tentar explicar em detalhe a jogabilidade de Dragon’s Dogma 2 iria certamente requerer uma série de artigos dedicados ao jogo, mas, no meu melhor, irei tentar resumir tudo de uma forma objetiva e simples de se perceber. O jogo começa com a criação de personagem, onde podes criar um humano ou um beastren (um humanoide antropomórfico com algumas características felinas). As opções para criar personagens são praticamente infinitas, sendo que tens uma série de barras para cada detalhe da face e corpo, juntamente com vários cabelos e cores.

Na criação da personagem também escolhes a tua vocation inicial, que será a tua classe. Estas vocations encaixam-se também em papeis para a tua party, sendo que o fighter, com a sua espada e escudo, está mais indicado para ser um tanque, e o archer, por exemplo, está indicado para fazer bastante dano concentrado num inimigo.

Irás jogar sozinho durante os minutos iniciais, sendo que se trata de um prólogo para te introduzir a algumas das mecânicas básicas do jogo, onde irás ser guiado de uma forma mais linear durante esta secção introdutória. Após o prólogo, irás ter então a hipótese de criar o teu pawn único, que será criado com os mesmos critérios da tua personagem principal. Este pawn irá estar sempre contigo, sendo então considerado o teu pawn principal, com os outros 2 espaços livres para poderes então contratar pawns de outros jogadores para te ajudarem nas inúmeras aventuras que irás experienciar.

Após criares o teu pawn receberás indicações para te dirigires até à cidade principal, podendo então ir a pé, ou utilizando uma carroça que te irá levar lá instantaneamente. Se escolheres ir a pé, terás a oportunidade de explorar logo uma zona do mapa do jogo. Ao chegares à cidade, deparas-te com 3 ou 4 missões que terás de completar, na ordem que bem entenderes, e da forma que bem entenderes. É aqui que começa o verdadeiro Dragon’s Dogma 2, largando-te a mão e libertando-te para este mundo, onde tudo é possível, e qualquer solução é viável.

A melhor descrição que dou ao jogo é que a viagem é o que interessa, não o destino. Ao sair da cidade pela primeira vez, deparei-me com um grupo de indivíduos a lutar com um grifo enorme. Para quem não está habituado, grifos logo ao início do jogo são uma receita para a morte, sendo que ainda não estamos fortes o suficiente para poder lutar com estes monstros de forma confortável. Considerando que estavam uns quantos NPCs para ajudar, eu aproveitei e juntei-me à festa, montando o grifo e atacando a sua cabeça.

O combate da sequela apresenta-se como uma versão melhorada do primeiro, onde tens combos básicos por cada arma, juntamente com habilidades exclusivas das classes, que podem apresentar utilidade ou mais dano, como poderes usar o escudo de um fighter para outro membro da party ser propulsionado no ar, ou algo simples como um relâmpago gigante que ataca vários inimigos numa área. Onde o combate realmente se desenvolve é na capacidade de poderes agarrar os inimigos para os atirar, ou, no caso de gigantes, poderes agarrar-te e trepá-los, podendo atacar os pontos fracos com mais facilidade. Obviamente que não poderás estar agarrado por muito tempo, sendo que tens uma barra de stamina que vai descendo progressivamente na duração da tua escalada, havendo aqui alguma exigência ao jogador para ser um pouco estratégico e manusear a sua stamina de forma mais cuidadosa.

Com o meu currículo de Dragon’s Dogma já bastante saudável, lá consegui derrotar o grifo, juntamente com os meus pawns e os NPCs que estavam presentes. Foi aqui então que me apercebi do porquê desta série ser algo que eu tanto venero e adoro. Eu tinha um objetivo em mente, com um destino já estipulado, mas a imprevisibilidade de tudo é um mar de surpresas e entusiasmo que é quase impossível de explicar. Muitos poucos mundos abertos encorajam o jogador a simplesmente andar e explorar ao que considero um ritmo lento, mas Dragon’s Dogma, e, por sua vez, Dragon’s Dogma 2, fazem do seu mundo dinâmico o fator mais interessante do jogo inteiro. Perder horas a explorar tudo o que encontramos no caminho para um objetivo da história, ou de uma das várias missões secundárias presentes, nunca se tornou cansativo ou aborrecido. O mundo dinâmico de Dragon’s Dogma 2 é onde as verdadeiras histórias irão ser contadas, e o fato de nenhum jogador ir experienciar o mesmo é algo que é simplesmente brilhante.

Com isto, tenho a dizer que o grifo não foi a única coisa ridícula a acontecer na minha viagem para o objetivo. Sendo que quero evitar possíveis spoilers, tenho apenas a dizer que tive outro acontecimento ridículo envolvendo uma pedra que o meu pawn decidiu atirar para uma parede de rochas que soltou um dilúvio de água enorme, onde iriei deixar a vossa imaginação deduzir o resultado desta “pequena” interação. Isto são apenas 2 das centenas de histórias que experienciei nas minhas quase 100 horas no mundo de Dragon’s Dogma 2, e, nestas quase 100 horas, 99% delas foram de total diversão.

Em relação ao 1% que não achei divertido, temos então aqui as pequenas frustrações relativas ao design que simplesmente não apresentam qualquer substância ao jogo. Ao utilizares uma carroça para viajares entre as várias cidades, podes ser atacado no meio da viagem por inimigos que, por sua vez, podem partir a carroça, fazendo com que tenhas de continuar a pé. Ora, sendo que o jogo me dá a escolha de eu poder utilizar estas carroças, não entendo porque é que o jogador tem de ser castigado quando simplesmente quer-se despachar e chegar ao destino mais rápido. Isto torna-se mais frustrante após já teres explorado o mapa no caminho que a carroça leva, sendo apenas tempo perdido.

Outra frustração rege no fato de continuarmos com o mesmo sistema de fast travel do primeiro jogo. Gosto da ideia de podermos colocar os nossos pontos com os portcrystals limitados que se encontram no jogo, dando a liberdade ao jogador de decidir o que é importante. O que não acho necessário é o fato das ferrystones, o recurso que precisamos para podermos fazer fast travel para estes portcrystals, serem outro recurso limitado. Apesar de não ser difícil de arranjar uma quantidade saudável de ferrystones na segunda metade do jogo, o fato de isto ser um recurso limitado é algo que não faz sentido nenhum. Se formos pela lógica de que estas decisões encorajam o jogador a explorar o mundo, eu simplesmente refuto com o fato da exploração do mundo ser exatamente o melhor que o jogo apresenta, sendo mais que suficiente para encorajar o jogador.

A exploração do mundo apresentasse com a existência de vários pontos de interesses como campos de goblins ou tribos, grutas, e outros pontos mais únicos que irei deixar para surpresa de quem for jogar. A maioria dos pontos de interesse são as grutas, sendo bastante semelhantes às presentes em Elden Ring.

Claro que, ao explorares, também irás encontrar vários gigantes, como ciclopes, grifos, e dragões. Os dragões, considerando o nome do jogo, são sem dúvida o tipo de inimigo mais forte, sendo que não é recomendável o jogador os enfrentar durante a primeira metade do jogo (penso que conseguem deduzir facilmente como sei isto), dando ao jogador um objetivo de poder claro.

Um épico medieval para os ouvidos

Em termos de música, temos um claro foco numa sonoridade clássica, usando uma orquestra comum para criar um som épico de aventura num mundo de fantasia. Apesar da sua base simples, as composições demonstram melodias memoráveis e sentidas que elevam o ambiente de uma forma significativa.

Possivelmente um dos melhores jogos da geração

Dediquei esta secção para explicar um pouco o meu dilema inicial a pontuar este jogo. No que toca a Dragon’s Dogma 2, penso que se trata de um tipo de jogo que parece que foi feito especialmente para jogadores como eu. Apesar das suas óbvias imperfeições, eu não tenho qualquer problema em ignorá-las e, no que toca ao que sinto, o jogo é praticamente um dos melhores jogos que já joguei nos últimos anos.

A realidade é um pouco diferente e, ao refletir um pouco no assunto, o jogo apresenta algumas inconsistências que não podem ser ignoradas e que carecem de qualquer lógica benéfica para o jogo em si.

Dragon’s Dogma 2 é um jogo que simplesmente adoro, e como um grande fã da primeira entrada, é inspirador saber que a sequela apresenta-se com esta qualidade surreal, se bem que com alguma familiaridade. Assim que os problemas técnicos tiverem sido resolvidos (esperemos nós), é sem dúvida um jogo que irei recomendar sem pensar duas vezes.

Em Dragon’s Dogma 2, tu crias as tuas próprias histórias, e espero que experienciem uma onda de imprevisibilidade refrescante e dinâmica, tal como eu experienciei.

Um grande agradecimento à Ecoplay por nos ter cedido uma chave do jogo para análise.

+ Pontos Positivos

  • Um mundo aberto dinâmico e imprevisível
  • Combate super divertido
  • Montar monstros gigantes

– Pontos Negativos

  • Fast Travel incoveniente
  • Pequenas frustrações
  • História pouco presente
CONCLUSÃO
Um Escadote, Arisen!
9.7
dragons-dogma-2-analiseDesta vez, decidi ser tão imprevísivel como o jogo e apresentei a minha conclusão na última secção. Resumindo o que disse, temos aqui um dos melhores jogos da geração, onde tu, como jogador, é que contas as tuas histórias. Um jogo que, após estar tecnicamente viável, será uma recomendação vívida.