Numa era de ingenuidade, muito pelo peso que a Sega teve na Quarta Geração com a sua Sega Mega Drive, fiquei seduzido pela Sega Saturn.
A consola era um autêntico sonho durante a minha puberdade. Gráficos “3D”, tecnologia CD, ambiente Arcade nas nossas casas, grandes títulos e… Jogos caros para caraças! Sejamos sinceros: pagar 14 contos por um jogo naquele tempo era um autêntico luxo, apenas destinado para alguns. Como, naturalmente, era estudante, não tinha sequer hipóteses de sonhar em ter uma Sega Saturn.
Lembram-se dos lendários dos 599 USD proferidos pelo pai da Playstation durante a revelação da PS3? Então o que dizer dos 99.990$ no lançamento da Sega Saturn?
Os anos foram passando e com eles baixas de preços. Até que, em 1998, esta atingiu os 30 contos, mais coisa, menos coisa. Eu confesso que sempre estive virado para o lado da Sega até assistir a um episódio do Templo dos Jogos (sem conhecer o termo Hype). Fizeram um alarido sobre um tal de Final Fantasy VII, onde o mesmo foi reservado para o final do episódio.
Lembro-me tão bem do diálogo do rapazito que apresentava: “Durante a sua primeira semana no Japão este jogo vendeu milhões, esvaziando prateleiras e quebrando recordes de vendas. O nome deste fenómeno: Final Fantasy VII. E, agora, está pronto para correr nas Playstations Portuguesas!”
Eu nem podia acreditar! Os grafismos, as personagens, o ambiente tudo, tudo era perfeito! Naquele momento esqueci-me dos Shining Force, Guardian Heroes, e dos Virtua Fighters por completo. Não pensei duas vezes e fiz finalmente a minha escolha na que seria a sucessora da minha fiel Mega Drive.
Este jogo criou quase uma obsessão em mim. Todo o tempinho que tinha era sinónimo de procurar todo o tipo de informações, muitas delas através dos meus colegas na escola, ou em revistas. As conversas que tínhamos eram todas em redor deste jogo.
Finalmente, os meus pais ofereciam algo pelo meu esforço quando transitava de ano. Adivinhem qual foi a minha escolha? Uma Playstation, claro!
Porém, como o Bruno é um coração de manteiga que se derrete com facilidade e como o meu irmão teve um ano de 1998 para esquecer, resolvi fazer o mais certo de oferecer-lhe o Fifa World Cup 98, como jogo inicial. Para me entreter até adquirir o Final Fantasy VII, comprei o Crash Bandicoot para mim, bem barato, a um colega de escola – Black Label e tudo! Contudo, na altura não lhe achei muita piada, e só joguei um par de vezes.
Passaram-se semanas até descobrir que um dos meus amigos conhecia alguém com o Final Fantasy VII, e pedi-lhe o favor de pedir emprestado. Não sei exactamente se foi pela sua publicidade ou o jogo em si, mas Final Fantasy VII cativou até quem não era fã de RPG.
Como eram bons os anos 90 onde questionava por ajudar – contra tudo e contra todos. Finalmente, numa terça-feira ao final do dia, estava nas minhas mãos o grande Final Fantasy VII! Escusado será dizer que no verão de 1998 “hibernei”: era de manhã à noite a jogar Final Fantasy VII. Ao colocar o primeiro CD, deparei-me com a lendária FMV onde vemos o Cloud a saltar do comboio, e fiquei com o queixo caído porque a apresentação era essencialmente a de um filme – até com o logo a surgir no final.
Bem, em primeiro lugar, em matéria de RPG no conforto do meu lar, só tinha jogado Shining Force II e todas as mecânicas eram uma novidade para mim. Até mesmo nem sabia que precisava de um Memory Card (na altura 2,990$) para gravar as partidas.
Primeira desilusão com a Playstation: não ter memória interna. Alto e mal, pedindo e elevando os meus familiares aos altares, lá consegui dinheiro para comprar o Memory Card. Foram 4 dias dolorosos a ver o jogo ao lado da Playstation sem poder jogá-lo.
No entanto, as surpresas não acabavam aqui e ao chegar ao primeiro Boss, tive outra: como raios consigo derrotar uma máquina que me despacha com 3 ataques? Bem, existem duas maneiras: a primeira é estar atento ao que o Barret diz ao Cloud para não atacar enquanto a sua cauda estiver ao alto, porque assim vai contra-atacar com o seu laser.
A segunda (e a via que tomei): a da parvoíce – ficando a fazer combates para elevar os meus personagens até nível 12 ou assim. Só depois de reunir-me e falar do assunto com um amigo soube o que fazer.
Pouco depois, chegou o tutorial das matérias e aqui, simplesmente, não percebi nada. Só soube que equipava bolinhas nos buracos. Não sabia o que faziam, nem como usá-las. Também penso que este facto muito foi devido a só jogar platformers e jogos de luta até a essa data.
Continuei a minha jornada, cada vez mais cativado pelo jogo, personagens e história. Lembro-me de ficar chocado quando tive de disfarçar o Cloud de mulher, ou de sentir uma inquietação com o jogo porque cada vez mais o mesmo tomava contornos tanto de negros como de espectacular.
Mortes, uma fantástica batalha entre elevadores, o corajoso Cloud mestre de uma espada de 5 metros de altura com medo? Mas medo de quê? E que dizer de o grupo ser capturado e na manhã seguinte toda acordar com toda a gente morta deixando apenas um rasto de sangue ao som de uma música palpitante ao som de badaladas?
Também foram como eu e guardaram a vossa partida numa slot à parte só para assistir ao “badasserismo” do Cloud a bordo da sua Hardy Daytona? Não neguem, eu sei que sim.
Depressa descobri que o grupo tinha outro propósito além de rebentar reactores: Sephiroth, o super SOLDIER, anterior colega e ídolo de Cloud, desperta e com ele uma forte sede de vingança. Penso que estes minutos iniciais foram decisivos para introduzir esta personagem, e o lugar que conquistou diante de todos.
Depressa apercebi-me que os videojogos deixaram de ser coisas simples como recolher moedas, anéis, salvar reinos, ou derrotar cientistas obcecados por fabricar uma Death Star, com a ajuda de animais indefesos. Pela primeira vez, apercebi-me que um jogo pode ser tão rico como um filme, pode contar uma história e através das suas personagens demonstrar valores humanos.
Final Fantasy VII tratou-se também de uma história muito à frente do seu tempo, demonstrado o impacto ambiental de corporações a esgotar os recursos do nosso planeta. Este é, sem dúvida, um dos jogos que mais impacto teve na minha vida, embora hoje pareça arcaico. Ainda mais com um Remake de luxo, recentemente colocado à venda, não podemos deixar de sentir o seu legado dentro e fora do seu género, na cultura pop, e no seu mais recente Remake.
Deixo o apelo para que, mesmo que o estejam a jogar, deêm uma oportunidade ao Cloud versão Pinypon.