Desenvolver uma segunda sequela para qualquer pedaço de entretenimento vitorioso nas prateleiras não é tarefa fácil, por muito que os fãs do dito cujo queiram transparecer o contrário. Discursamos, claro, sobre um processo formado por uma linha ténue; uma semelhante à expressão idiomática corda bamba, e é tão fácil misturar as vozes barulhentas (leia-se feedback) da comunidade com a vontade do responsável decidir o que fazer com a sua propriedade intelectual. Felizmente, Ghostrunner 2 não padece de nada aqui escrito.
Divago sobre isto porque a One More Level padece sim de uma excelsa ginástica compreensiva da sua propriedade. É tão complicado apostar no que já funciona e colmatar o que está errado na construção de uma continuação, com receio de cair num sentimento enfadonho de mesmice, mas Ghostrunner 2 é um título que faz jus à palavra sequela e proporciona aos fãs o que estes adoraram da primeira iteração, agora reforçada por mais, maior e melhor. Ao mesmo tempo, embora não seja algo negativo a apontar, uma decisão deste calibre significa que os céticos do primeiro Ghostrunner não apreciarão o segundo.
Dito isso, Ghostrunner 2 é amplamente divertido e para quem vem do primeiro título (leiam esta ou esta análise) este transmite um bom equilíbrio entre familiaridade com os alicerces principais da jogabilidade, e o desafio de introduzir novidades no arsenal de Jack, personagem principal e titular ghostrunner, para este terminar os níveis da forma mais ninja-ciborgue-futurístico possível. Assim, desnecessário será adicionar que a equipa não reinventou a roda com a conceção dos níveis, mas fê-la centrifugar-se de várias formas.
Não obstante o trocadilho e duplo significado, Ghostrunner 2 proporciona-te níveis desafiantes, interessantes tanto a nível visual como auditivo, e uma harmonia muito bem estudada entre deslocação vertical e horizontal. Apesar da fórmula atual já fugir um pouco ao estilo gauntlet, e com isto refiro a cadência em praticar parkour e exploração num nível até chegar a uma sala com inimigos para derrotar, desta vez sente-se um nítido esforço em proporcionar maneiras diferentes não só de abordar os combates, sejam por via de habilidades novas ou mestria da topografia, mas também em planear a ordem e rota a tomar.
O trocadilho anterior também não foi por mero acaso, pois uma das surpresas em Ghostrunner 2 são os segmentos pensados no motociclo de Jack. Carregados de adrenalina pela velocidade e banda sonora excelente, com direito a uma referência em primeira pessoa ao Akira Slide, estes elevam a sequela um patamar acima do original, transcendendo limitações em level design do antecessor. Embora, ocasionalmente, a física provoque alguns bugs, com o motociclo a tropeçar ou ficar preso, os segmentos funcionam sem quebrar ritmo e entusiasmo. Porém, visualmente, estes níveis são paupérrimos, uma decisão com certeza tomada para evitar dissonância narrativa e poupar no desempenho.
De qualquer forma, fora um par de vezes em que o meu GPS interno desnorteou-se sem razão, os níveis estão bem construídos, e alguns deles muito mais espaçosos, proporcionado uma falsa sensação de open world que, com tempos de carregamento quase inexistentes entre, quase chega a enganar. Posto isso, pelo menos no que toca à construção de níveis o saldo final, nesta sequela, resulta num Ghostrunner maior e mais divertido com imensas set pieces espetaculares e objetivos diferentes para além do “derrota os inimigos para proceder.”
Foi igualmente divertido (e fácil, graças a um GR1 Recap no menu de extras) acompanhar o enredo, este utilizando técnicas narrativas, como analepses ou justiças poéticas, para expor e dramatizar o conto de Jack. Uma trama interessante, apesar de começar de forma tépida e branda até chegada de uma reviravolta inesperada. Para expandir a interação do jogador com o enredo existe um polo central onde Jack regressa frequentemente, e é aqui que se conversa com personagens, aprende-se sobre elas, o mundo e atualiza-se o arsenal cibernético. Dei por mim mais investido em comparação com o título antecessor, desejando até voltar para ouvir novidades.
Dito isso, Jack dispõe de um conjunto de ferramentas cibernéticas que o ajudam nos contextos de combate, exploração e resolução de quebra-cabeças e essas habilidades ativas, assim como outras passivas, são atualizáveis através da motherboard, uma mecânica composta por filas e colunas que alberga vários chips para, por exemplo, aumentar o número de shurikens arremessados ou diminuir o custo de energia a elas associadas.
No início achei o sistema pouco intuitivo pois cada fileira, no começo, só hospeda uma categoria de chips. Porém, rapidamente percebi as suas limitações, permitindo traçar estratégias e adaptar Jack ao meu gosto e necessidade. Achei curioso alguns chips incluírem condições para desbloquear outras melhorias, como necessitar de ser colocado no fim da fila, ou estar afastado de outros chips provando este ser um sistema divertido, flexível e equilibrado, onde cada jogador irá encontrar a capacidade de enaltecer como mais gosta de ser o ninja cibernético dos seus sonhos.
Contudo, proceder com estas melhorias necessita de colecionáveis dispostos em cada nível. Estes aumentam a capacidade de juntar mais chips na motherboard de Jack, e são facilmente encontrados prestando atenção ao minimapa durante a aventura. Não são os únicos, visto que Ghostrunner 2 disponibiliza cosméticos como aspetos diferentes para a espada ou luva de Jack para colecionar.
Comparativamente com o anterior os bosses continuam divertidos, desafiantes mas, ao mesmo tempo, acessíveis. São difíceis, sim, mas cada um dispõe de checkpoints generosos e mostram claramente como podem ser danificados, utilizando um quíte legível de ataques para impedir o progresso. O que Ghostrunner 2 não faz (felizmente) é dar a mão e informar qual habilidade utilizar para explorar as suas fraquezas. Por exemplo: uma das habilidades, chamada Tempest, expele uma rajada de vento da palma da mão, permitindo repelir de volta alguns projéteis.
Um destes bosses, reminiscente do primeiro encontrado no título anterior, é um feito massivo para a One More Level a vários níveis, desde o fator diversão, até à injeção de adrenalina e à ambição da equipa em fazer mais e melhor. É também, no entanto, onde o desempenho de Ghostrunner 2 mais vai abaixo, sendo das poucas alturas onde os 60 fotogramas por segundo mais sofrem. Porém, não quero com isso transparecer que o segmento seja injogável, ou detenha mais momentos desses.
Fora esse pequeno percalço Ghostrunner 2, sob preset Performance Mode, apresenta-se como um videojogo bonito e excecional na tradução de um mundo pós-apocalíptico cyberpunk, repleto de néons e uma atmosfera que tanto dá para sombria como brilhante e colorida. Apesar do modo de desempenho ser o mais recomendado, nunca achei ser impeditivo de uma boa experiência visual embora, ao mesmo tempo, não ache este título demonstrativo do grafismo de nova geração.
Considero-o, no entanto, uma maravilha técnica e acessível não só por uma abundância de checkpoints como referido anteriormente, mas também pelos quase inexistentes tempos de carregamento; coisas instântaneas sem explicação humana. Seja após uma morte ou a carregar um nível, depois de inicializar Ghostrunner 2, nunca tive tempo de largar o comando e agarrar o telemóvel. Ainda assim, por falar em feitos técnicos, admito sofrer um bug num nível onde o som cortou por completo, produzindo efeitos sonoros ocasionais muito irritantes e ríspidos na sua ausência. Resolveu-se rapidamente com um recomeçar da aplicação, mas fica o reparo.
Apesar de achar o preço base de 39.99€ justo para o que Ghostrunner 2 traz à mesa, a verdade é que existe pouca replayability. Após término do modo história (cerca de 12 horas) os incentivos disponíveis para voltar a encarnar Jack são revisitar níveis e terminá-los em tempos mais curtos, ultrapassar desafios especiais em cada nível com medalha de ouro, utilizar o Photo Mode ou completar um atividade chamada RogueRunner.exe. Esta uma espécie de minijogo Gauntlet com alguns percursos onde Jack recebe power-ups por cada sala desbravada, semelhante ao que existia no primeiro Ghostrunner chamado Wave Mode.