Tenho algo para confessar: nos dias que correm são poucos os videojogos que prendem a minha atenção. Tanta experiência triplo-A ou indie que puxa pela raiz do cabelo para focar os holofotes em mecânicas que não suscitam o mínimo interesse e não puxam pelo instinto primordial de um jogo: diversão. Confesso também que Ghostrunner nunca chamou a minha atenção, nem sabia da sua existência, mas graças ao grande Bruno Vieira (podem ler a sua análise aqui) consegui descobrir o filho ilegítimo entre Cyberpunk 2077 e Mirror’s Edge.
Como a Squared Potato já detém uma análise a Ghostrunner não aprofundarei muito o que já foi referido anteriormente pelo meu exímio colega, fazendo desta “adenda extensa” um resumo generalista do que o pacote ao todo, retalhado a 39.99€ na PlayStation Store Portuguesa, pode oferecer ao comprador. Não aprofundar muito não significa, porém, que eu não dê aquele toque à lá Ulisses já tão conhecido pela comunidade.
Ghostrunner: Complete Edition, na PlayStation 5, é um videojogo incomum e refiro isso como o maior dos elogios! A anterior menção sobre ser o filho ilegítimo entre Cyberpunk 2077 e Mirror’s Edge também não é brincadeira, ambos considerados títulos de alto gabarito por dois estúdios muito diferentes. Mesmo que a conceção ideológica e mecânica (no seu sentido mais puro) entre estes dois últimos videojogos produza um resultado como Ghostrunner, este consegue ainda deter a sua identidade, por refinar ambos os aspetos, aliados a uma narrativa interessante.
O mundo em exposição é uma deliciosa e vistosa caracterização de um dos subgéneros mais acarinhados da ficção científica: cyberpunk. Uma temática com foco numa distopia futurística, representada sempre por uma força opressora frente à classe mais baixa em conjunto com o abraçar de tecnologia avançada. Ghostrunner não transmite estes temas e ideias vis-à-vis com o jogador, como grande parte dos videojogos o fazem via cinemáticas espalhafatosas, optando por permitir que a estrutura, arquitetura e atmosfera dos níveis desempenhem esse trabalho. Se gostas deste subgénero encontrarás muito por onde apreciar, mesmo que a disposição de vários elementos nos níveis quebrem um pouco a imersão por estarem demasiado gameificados, quero com isto referir que existe, por exemplo, uma rampa ou uma parede deslocadas, sem sentido algum, só para auxiliar a travessia de um obstáculo.
Ghostrunner puxa inspiração depois pela palhinha do pacote de sumo Mirror’s Edge, um título entusiasmante que deslumbrou a crítica no seu lançamento pelo foco em parkour, atividade radical associada a um estilo de corrida sem limites não obstante qualquer obstáculo, mas com um sistema de combate fraquíssimo (algo que as sequelas tentaram (palavra-chave) resolver). Dito isso correr pelas paredes, deslizar pelo chão e encadear movimentos em rápida sucessão são a ordem do dia em Ghostrunner e quanto mais rápido conseguirmos fazer tudo isto melhor. Contudo, o que destaca o título em epígrafe dos seus congéneres é um sólido e competente sistema de combate que acasala todos estes elementos para autênticos disparos de adrenalina, acompanhado sempre por uma banda sonora dentro do género Synthwave. Atrevo-me inclusive a relatar que Daniel Deluxe (cognome do compositor deste videojogo) está para Ghostrunner como Mick Gordon está para DOOM.
Durante a aventura principal o Ghostrunner encontrará vários obstáculos sejam eles parte do meio ambiente percorrido ou hostis tanto robóticos como vivos, utilizando várias habilidades ao seu dispor para os ultrapassar. Por cada vez que isto acontece sempre senti que cada nível era uma “sala” e não um elemento interligado de um mundo maior (algo que já não acontece tanto em Project Hel, o DLC). Ademais tanto o cenário como os inimigos estão dispostos de uma maneira pouco natural quebrando um pouco a imersão; felizmente esse mesmo problema pode ser abordado de várias maneiras, não existindo uma forma única de chegar até ao fim. O Ghostrunner também poderá alterar as suas habilidades utilizando melhorias numa grelha que relembra o Navi Customizer de Mega Man Battle Network 3.
A personagem Hel, estrela do DLC Project Hel, traz consigo uma aventura um pouco diferente. Não obstante o cenário reutilizar texturas e elementos reciclados da história principal, todos os níveis parecem completamente novos, agora com um pouco de backtracking em boa medida para transmitir uma sensação de serem um pouco mais longos. O aspeto que mais gostei do DLC foi o controlo de Hel ser mais caótico e frenético graças ao seu híper salto, comparativamente com o titular Ghostrunner, este mais flexível e metódico.
Não consigo confirmar se o seguinte é exclusivo à iteração da Ps5 (versão em análise), mas um dos pontos mais impressionantes foi a rapidez do respawn após ser derrotado. Passo a explicar: Ghostrunner é uma injeção de adrenalina quando tudo corre bem (trocadilho intencional) mas é igualmente desafiante em vários momentos; por vezes demasiado desafiante. Não fossem os tempos de carregamento quase inexistentes, logo após o herói titular ser derrotado, frustração era um sentimento quase garantido. Ajuda também a jogabilidade ser sólida, coesa e divertida, mantendo sempre a atenção presa ao mundo empurrando para o nostálgico sentimento “só mais uma vez”.
Contudo Ghostrunner não é um título que perdure com um modo história muito longo. Disposto por dezassete níveis na aventura principal e sete no DLC Project Hel estimo que, caso queiras atingir o cobiçado troféu de platina (45 troféus ao todo) demores cerca de umas generosas quinze horas. Pode parecer etiquetado a um valor alto, mas esta Complete Edition traz também todos os cosméticos previamente lançados e as atualizações gratuitas até então como Assist Mode, Photo Mode, Kill Run Mode (género Time Trials) e Wave Mode (modo roguelike por ondas) prolongando a longevidade do videojogo.
Resta mencionar que a versão PlayStation 5 de Ghostrunner: Complete Edition tinha, nas suas opções principais, botões para ligar ou desligar a tecnologia Ray Tracing, assim como permitir ou não uma taxa de 120 fotogramas estáveis e confortáveis. Fica por lamentar, no entanto, alguns erros como a personagem ficar presa no cenário (por duas vezes) ou a habilidade de correr pelas paredes não registar muito bem, causando algumas mortes frustrantes. Também não existem praticamente opções de acessibilidade algumas (uma opção para daltónicos, por exemplo).
Um agradecimento à 505 Games por gentilmente nos ter cedido um código para análise.