Depois de anos à espera, chegou o momento de reencontrarmos Max Caulfield como protagonista de Life is Strange, agora numa nova história, alguns anos após os acontecimentos do título pioneiro. Life is Strange: Double Exposure apresenta-nos Max Caulfield mais velha e num contínuo processo de autodescoberta. Por ter colocado de lado o poder de viajar no tempo, Max, apaixonada por locais abandonados e aparentes liminal spaces, foi aprendendo a viver no presente, abandonando os contratempos que o sobrenatural pode representar. No entanto, a tranquilidade da vida fora de Arcadia Bay não podia durar para sempre.

Escrever uma análise de Life is Strange é sempre uma armadilha, porque não é simples desconstruir o jogo sem entrar em detalhes da narrativa, que é, naturalmente, o foco de tudo. Por sua vez, entrar nestes detalhes poderia implicar eventuais spoilers, algo que vou evitar, para que possam ler este texto de forma descontraída e sem chocar com acontecimentos do enredo.

Em traços gerais, Max Caulfield regressa aos caminhos de Life is Strange não como aluna na Blackwell Academy, mas como professora de Fotografia na Universidade de Caledon. Num ambiente pouco citadino, como aqueles a que a série nos acostumou, os redores da universidade e a própria instituição são o pano de fundo de Life is Strange: Double Exposure, numa compilação de cenários acolhedores, com os quais é possível interagir e onde temos oportunidade de explorar diálogos e as diversas ramificações desta nova narrativa.

A misteriosa morte de uma das personagens é o ponto de partida da história. Como regressar ao passado é coisa do próprio passado, Max descobre agora o poder de saltar entre realidades paralelas, numa dualidade desencadeada e dividida pela trágica morte que dá início ao jogo. Esta dinâmica, apesar de confusa e por vezes dispensável, torna-se interessante, não necessariamente por ela própria, mas pelos pequenos nós que vamos desatando, no sentido de conhecer personagens, histórias de vida e contextos alternativos em ambas as realidades.

Uma nova história

À semelhança de outros títulos da série, Life is Strange: Double Exposure é composto por cinco episódios, lançados em simultâneo. Boa! Para além disso, a identidade indie do original permanece ao longo de toda a série, bem como as excelentes bandas sonoras. A atmosfera única que tão bem caracteriza este universo está claramente presente em Double Exposure, apesar de a história, o contexto e as personagens serem novos. A arte do jogo está incrível, o que me levou a capturar diversas imagens ao longo da viagem, sobretudo em momentos de reflexão, nos quais apenas a música nos faz companhia. Em contrapartida, as transições de cena para cena não são totalmente fluidas, eventualmente por uma questão de renderização, algo que, não sendo grave, não é de todo agradável.

A dinâmica é inicialmente confusa, mas torna-se intuitiva com o tempo. Ao explorar duas realidades em simultâneo, acessíveis através de pontos específicos espalhados pelo cenário, Max vai descobrindo informações que podem ser utilizadas na realidade oposta, no sentido de superar obstáculos, resolver pequenos puzzles e progredir na busca por respostas. Nem sempre é simples ter em mente o que acontece com cada personagem em cada linha temporal, ainda assim, o jogo fornece um diário, mensagens de telemóvel e indicações pontuais que vão facilitando o enquadramento.

Ao longo da história principal, que demorei cerca de 15 horas a concluir, várias personagens e acontecimentos cruzam a ação de Max, desencadeando pequenos e grandes dilemas, sem que algum seja particularmente difícil, ao contrário do que acontecia em Life is Strange e Life is Strange 2. Apesar de sentirmos o efeito Life is Strange no ar, houve eixos que infelizmente se perderam, ou pela construção da história ou pela natural maturidade da protagonista, que é agora confrontada com dilemas de natureza mais abstrata e menos imediata. Nesta viagem pela vivência das várias personagens e pela história da própria universidade, há muitas pontas soltas que ficam por explicar e acontecimentos ao longo do enredo que parecem incongruentes e pouco orgânicos. A minha questão é: estará a explicação destes pontos reservada para uma sequela? Espero que sim, porque dúvidas desnecessárias e a ausência de coerência não são fatores propriamente positivos.

Por outro lado, Max considera, em diversas ocasiões, que os seus próprios poderes são uma maldição e uma coisa é certa: demasiada ficção em torno de poderes esvazia Life is Strange de algum do encanto que tem, nomeadamente o que reside na inevitabilidade de acontecimentos, na vulnerabilidade das personagens e na vertente mais realista e crua do enredo. No caso de Life is Strange: Double Exposure, vários elementos do espectro sobrenatural eram totalmente dispensáveis, o que tornaria a história mais interessante, mais natural e menos forçada.

História apressada

Ainda que não inclua spoilers, este capítulo tem conteúdo que pode influenciar a leitura e o consumo do jogo. Se preferirem ignorar, passem para a avaliação!

Life is Strange: Double Exposure é um jogo praticamente perfeito até ao final do terceiro capítulo, com ligeiras falhas que são perdoadas pela qualidade de tudo o resto. Há conforto e desconforto, conteúdo, mistério e vontade de explorar. No entanto, a partir de determinado momento, a história parece apressada, deixando demasiadas falhas, e nota-se a ausência de um gancho plausível que segure a atenção até ao final. Final esse que, sem entrar em detalhes, é altamente discutível. Sinto que a narrativa foi perdendo fôlego, na medida em que a excelente ideia, as personagens com potencial e a atmosfera perfeita acabaram por não ser honradas com a devida execução.

Talvez cinco episódios não fossem suficientes. Talvez os episódios devessem ser mais extensos. Talvez devesse existir um pós-jogo que permitisse explorar e compreender mais. Talvez a história pudesse ser contada com menos elementos, para não se tornar confusa. Apesar de manifestar qualidade, Life is Strange: Double Exposure perdeu-se no caminho da própria narrativa e na enchente de conteúdo que procurou oferecer.

Life is Strange: Double Exposure, da Deck Nine, foi inicialmente lançado a 29 de outubro e está disponível para PlayStation 5, Xbox Series X & S, PC e Nintendo Switch.

Um agradecimento à Ecoplay por nos disponibilizarem um código para a plataforma PS5.

+ Pontos Positivos

  • Atmosfera Life is Strange
  • Banda sonora
  • Personagens e enredo com potencial

– Pontos Negativos

  • Pontas soltas
  • Progressão da história
CONCLUSÃO
Inquietante
7.5
life-is-strange-double-exposure-analiseHá alguns anos que esperávamos o regresso de Max Caulfield e aqui está ele. Numa viagem que ultrapassa o espaço e o tempo, Life is Strange: Double Exposure traz-nos uma história nova e expansiva, que, apesar de mais complexa, mantém diversos traços que tornaram o universo de Life is Strange especial desde o primeiro minuto. Com algumas pontas soltas e sem conseguir superar outros títulos da série, não deixa de oferecer uma história misteriosa e imersiva a todos os fãs.