Ninguém Quer Isto (Nobody Wants This) é uma comédia romântica que teve grande impacto na Netflix aquando a sua estreia no ano passado. Por todos os cantos, éramos bombardeados com opiniões dos críticos e do público perante o que muitos denominaram a perfeita junção entre Fleabag e When Harry Meets Sally, pelo que finalmente decidi dar-lhe uma oportunidade.

Tendo como pano de fundo o caos que são os encontros modernos, com a adição de religião à mistura, e exemplificando todas as formas inesperadas que levam o amor a nos deixar cegos, Ninguém Quer Isto é afiado, expressivo, complicado mas, surpreendentemente, sincero na sua abordagem.

Com uma temporada de 10 episódios, a série criada por Erin Foster e inspirada pelas suas experiências reais, é uma óptima sugestão para os dias frios de inverno em que queiras ser relembrado de que há esperança, mas também diversão, embutidas na procura pelo nosso par ideal.

Sinopse

Ninguém Quer Isto segue o inesperado namoro entre um rabino americano convencional recém-solteiro (Adam Brody) e uma mulher agnóstica cheia de bagagem (Kristen Bell) que é co-host de um podcast com a irmã sobre relacionamentos. 

Entre tentarem encaixar as suas vidas demasiado divergentes uma na outra e convencer o resto do mundo de que são feitos um para o outro, Noah e Joanne acabam por embarcar numa viagem de autoconhecimento e de sacrifício, mas também de abraçar uma ternurenta relação amorosa que te derreterá o coração.

Personagens

Não consigo pensar num único papel em que Kristen Bell não tenha brilhando (sim, estou a olhar para ti, When in Rome), e Ninguém Quer Isto não é excepção. Ela consegue pegar nas personagens mais insípidas ou desagradáveis (pelo menos à primeira vista) e convencer-nos de que todos merecemos uma oportunidade de nos provarmos, acabando por nos deixar completamente rendidos e a torcermos pela sua vitória ao longo das suas muitas auto-sabotagens. 

A sua química e cumplicidade com Adam Brody são excepcionais e facilmente nos esquecemos de que ambos são actores e não um casal real enquanto seguimos a sua relação – diria, até, que às vezes me senti quase como uma voyeur a intrometer-me no seu seio íntimo porque eles foram realmente bons a vender o seu peixe. Apesar das suas claras diferenças, ficamos com a sensação de que Joanne e Noah são exactamente aquilo de que ambos precisam para serem felizes.

É, também, interessante seguir a evolução de Joanne enquanto pessoa, e como a sua relação com Noah começa a moldar a sua vida tanto pela positiva como pela negativa, levando-a a ser confrontada com situações e decisões que, provavelmente, não teria de ser sujeita com outra pessoa qualquer (que não um rabino). O desconforto e a adversidade ajudam-na a crescer e a, finalmente, aceitar-se a si própria.

Já Noah mantém-se constante durante este tempo, fiel a si mesmo, apresentando-se como um forte pilar tanto para a sua comunidade como para a própria Joanne e a sua família, navegando as expectativas de todos à sua volta e tentando equilibrá-las com os seus próprios desejos pessoais sem causar demasiados estragos. 

Não estamos perante um homem egoísta que só corre atrás da heroína quando lhe dá jeito ou que facilmente se deixa levar pelos sentimentos mais primitivos, levando a demasiadas confusões e montanhas-russas emocionais. Estamos perante um homem seguro de si e forte o suficiente nas suas convicções para também deixar a heroína segura dos seus sentimentos e intenções. Eu sei, revolucionário!

Já o irmão de Noah, Sasha (Timothy Simons), e a cunhada Esther (Jackie Tohn), retratam o outro lado das relações amorosas mais tradicionais, com o seu casamento perfeito judeu, uma cumplicidade aprimorada ao longo de anos e uma base sólida que parece ser capaz de resistir a qualquer ataque. 

Ambos os casais ilustram gerações diferentes, mas também, mundos completamente à parte que, no caso de Noah e Joanne, colidem e tentam unir-se apesar dos obstáculos, e no caso de Sasha e Esther, sempre estiveram unidos sem ter sido preciso grande esforço. No entanto, há sempre pequenas fissuras na parede que, com a pressão correcta, poderão vir a tornar-se grandes problemas e ambos os casais ilustram na perfeição duas respostas distintas, cujo resultado acaba por ser ditado pela força do amor entre eles.

Também as outras personagens secundárias acabam por trazer algo de genuíno à história: não existe uma única que possamos dizer ser perfeita ou isenta de falhas; na verdade, é o oposto: cada uma sobressai na sua desordem, na sua toxicidade, na sua autenticidade, em serem aquilo que são. 

A irmã Morgan (Justine Lupe) é, talvez, das mais fracas personalidades da série, e mesmo assim consegue sobressair por ser tão descaradamente ela própria e relembrar-nos de que não faz mal não ter tudo planeado. 

História

O enredo de Ninguém Quer Isto está longe de ser o mais original que se pode encontrar por aí; porém, é a sua execução que realmente faz a diferença e confere a esta rom-com um sentimento de pureza e vulnerabilidade que facilmente captura o coração dos espectadores.

Foi refrescante não ter de ser bombardeada com os habituais dramas e reviravoltas insólitas que muitos escritores acabam por se apoiar para criar uma história cativante e excitante, que até pode tornar-se muito viciante mas que, no final do dia, não passa de palha para espantalho. 

Não que Ninguém Quer Isto não tenha os seus pequenos momentos (estamos a falar de um romance, afinal de contas) mas nunca os estende demasiado para criar tensão desnecessária ou apimentar o enredo geral – fá-lo, simplesmente, quando é oportuno e faz sentido. 

Apesar de ser 90% comédia, acaba por tocar em temas bastante difíceis e relacionáveis de uma forma revigoradora, renunciando a fórmula dramática e complicada a que outros títulos nos habituaram, e criando simplesmente uma forma de resolução própria. 

Claro que também tem os seus clichés, mas com uma pitada especial. Dizer que revolucionou o género? Não de todo, mas definitivamente proporcionou momentos de rir à gargalhada e surpreendeu pelo seu encanto e alma.

O final deixou-me algo desapontada, mas não menos ansiosa pela chegada da segunda temporada (já anunciada e, de momento, em produção) porque, realmente, sinto necessidade de saber o que se vai passar a seguir e o que a história reserva não só para Joanne e Noah mas também para as restantes personagens, cujas narrativas ficaram igualmente em banho-maria.

E, já agora, deixo aqui a nota de que, para além de termos Kristen Bell nesta série, temos também a fantástica D’Arcy Carden, ambas de The Good Place – mais um óptimo motivo para não perderes Ninguém Quer Isto.

Clica aqui para assistires a Ninguém Quer Isto.

CONCLUSÃO
Adorável
8
ninguem-quer-isto-analiseNinguém Quer Isto tem um título bastante irónico, porque certamente não quis fazer outra coisa senão acompanhar a série desde o início ao fim. Com um guião divertido, engenhoso e cheio de vida, personagens carismáticas, irreverentes e, acima de tudo, reais, e um elenco repleto de química e talento, penso que também tu ficarás agarrado ao ecrã para seguir esta rom-com moderna com elementos tradicionais e dilemas bastante relacionáveis, sentindo um calorzinho interior ao seres relembrado de que o amor verdadeiro consegue vencer até mesmo quando tudo está contra ele.