Acredito que, mesmo que sejas fã de RPG japoneses, nunca tenhas ouvido falar na saga Rhapsody. Bem, é normal. Além de ser um RPG de nicho, a sua aventura original da PS1 nunca chegou à Europa (apenas o fez anos mais tarde, na sua nova versão para a Nintendo DS) e as restantes aventuras ficaram comodamente a apreciar o sol nascente do Japão, sem nos fazerem qualquer visita… até hoje.

Criado pela Nippon Ichi Software nas suas andadas iniciais no mundo dos videojogos, Rhapsody ficou conhecida pelas suas peças musicais. Diversos elementos da história são contados mediante musicais cheios de personalidade, raramente visto neste nos videojogos e que realmente desejo que fossem mais comuns. 

Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles inclui o segundo e terceiro jogo da saga, sendo estes Rhapsody II: Ballad of the Little Princess lançado originalmente na PS1 e Rhapsody III: Memories of Marl Kingdom lançado na PS2. Este pack, disponível na PS5, Switch e PC vem com as remasterizações destas aventuras traduzidas pela primeira vez ao inglês. 

O segundo jogo, Ballad of the Little Princess, acontece mais de dez anos depois dos eventos do primeiro jogo, seguindo os passos da travessa Kururu, filha da anterior protagonista, Cornet, que deseja empreender no mesmo tipo de procura que a sua mãe, encontrar o seu príncipe encantado, seguindo o lema “Take the initiative“.

Já o terceiro jogo, Memories of Marl Kingdom, é um jogo dividido em capítulos, em diferentes períodos de tempo e com diversos protagonistas. Aqui é-nos dado a conhecer mais sobre os diversos personagens e o mundo em si.

Será que estes jogos incluídos em Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles sobreviveram ao teste do tempo? Merecem a tua atenção? Vem descobrir.

É Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles a história de amor que vocês tanto desejam?

História

A história da saga caracteriza-se por histórias muito simples, em que a protagonista quer encontrar o seu grande amor, o seu príncipe encantado, havendo muita comédia, tanto na história como nos personagens, conduzidos por momentos adoráveis, presentes a cada canto. É um enredo suave e que todos podem desfrutar, inclusive os mais pequenos. 

A entrega original e a segunda são ambos muito parecidos no que o seu enredo conta e, inclusive, nas diversas cenas e personagens/vilões que encontraremos, destacando-se aqui a vontade da protagonista, Kururu, em conhecer mais sobre o mundo que a rodeia. Se forem daqueles que tiveram oportunidade de jogar ao primeiro Rhapsody, o segundo inclui muito do que fez o original tão especial, reforçando mais o backstory dos protagonistas. 

Já o terceiro jogo leva-nos por caminhos mais bifurcados que, no seu núcleo, é uma história de personagens adoráveis afrontando diferentes desafios, dando este último jogo mais importância às conexões humanas, tendo momentos que puxam por uma lagriminha aqui e ali.

Ambas as histórias não possuem grandes reviravoltas, seguindo sempre o caminho esperado. São histórias focadas para um público mais jovem ou alguém como eu que deseja afastar-se de tantos melodramas e entrar num pequeno mundo onde o sentimento de feel-good e alegria estão à ordem do dia.

Os musicais presentes são uma forma muito divertida e original de apresentar diversos elementos-chave do argumento e motivações.

Musicais, uma forma genial de transmitir sentimentos!!

Os personagens são divertidos e com personalidades diferenciadas. Em Ballad of the Little Princess, seguimos Kururu na sua busca do seu príncipe, onde diversos personagens se juntarão à aventura, destacando a sua grande amiga Crea que fará o possível (e impossível) para estar junto a ela. Se tiverem jogado ao primeiro Rhapsody, notarão grandes semelhanças não apenas na história como nos personagens principais e vilões. 

Já em Memories of Marl Kingdom, os personagens estarão sempre a mudar dependendo do capítulo em que estejamos, sendo estes personagens, por norma, os mesmos que já vimos em aventuras anteriores, querendo o jogo aprofundar mais neles, tanto protagonistas como vilões. 

Os Puppets, marionetas que alguns personagens (nomeadamente Cornet e Kururu, mãe e filha, protagonistas da primeira e segunda entrega respetivamente) têm a possibilidade de entender e falar, oferecem também alguns diálogos e interações interessantes, além de uma grande ajuda em combate.

Ballad of the Little Princess é um bom ponto de partida na saga

Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles apenas inclui a segunda e terceira entrega (estando a primeira acessível no PC e Switch através do Prinny Presents NIS Classics Volume 3). A segunda entrega é uma boa porta de entrada, sendo uma aventura semelhante à primeira nos temas e objetivos que trata, sem depender em demasia desta. Já com a terceira entrega, é importante terem jogado a ambos ou, ao menos, ao segundo jogo, uma vez que esta trata de dar um ponto final à saga, respondendo a diversas questões e dando novos pontos de vista a conteúdos vistos anteriormente.

Visuais

Se há algo que têm em comum ambas as entregas incluídas em Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles é o fantástico Pixel-art dos seus personagens. São detalhados e com diversas animações. Na primeira entrega, eram nas peças musicais onde se concentravam a maioria das animações. Agora, em ambas entregas, a Nippon Ichi Software dedicou mais recursos para que os protagonistas e NPCs pudessem demonstrar todo tipo de ações e emoções através da melhoria e aumento das animações, um trabalho a destacar.

Em Ballad of the Little Princess, temos fundos pré-renderizados, carregados de detalhe e beleza, contudo além de serem de reduzida dimensão repetem-se muito nas diversas masmorras. Muito deste conteúdo é reciclado da primeira entrega, sendo as animações a principal evolução.

Já em Memories of Marl Kingdom, os fundos são em três dimensões, tendo perdido parte da sua identidade e alguns detalhes visuais, não conseguindo igualar a beleza dos fundos pré-renderizados da anterior entrega. Nota-se nas masmorras uns fundos muito desleixados, com umas texturas em alguns casos como papel de parede, sem qualquer volume e detalhe. Isso sim, os cenários ganharam algo de dimensão e menos ecrãs de carregamento, mas está longe de ser o trade-off perfeito.

Esta crítica que estou a fazer aplica-se mais agora do que há 20 anos atrás. Ou seja, acho que um jogo em 2D de há 20 anos atrás envelheceu muito melhor que um em 3D da mesma época.

Neste remaster ambos os títulos apresentam diversas opções de visualização por meio de filtros. Podem escolher um visual semelhante à visualização em ecrãs CRT, outros mais suavizados ou mesmo desativar os filtros. Na terceira entrega, ainda têm a possibilidade de um filtro específico para texturas, podendo escolher entre o clássico e o melhorado. 

E é nesta última entrega que o jogo apresenta um visual geral bem mais definido, graças ao seu 3D que apesar de menos detalhados e charmosos que os fundos pré-renderizados, se adaptam melhor a esta conversão.

O desenho artístico está num bom nível, destacando o desenho dos diferentes Puppets. Tudo muito reminiscente dos estilos anime dos finais dos anos 90, daqueles de estilo shoujo/slice of life, especialmente os retratos durante as conversas, um clássico.

Jogabilidade

Estamos diante um RPG por turnos em ambos os jogos presentes nesta coleção. 

Na segunda entrega o sistema é muito tradicional, tendo diversos companheiros em batalha, até quatro. Neste sentido, há que dizer que o jogo adora retirar membros da equipa e colocar outros, havendo muitos momentos onde apenas temos dois personagens ativos, devido a razões de história. Isto pode tornar chato o estar constantemente equipando os personagens que entram e fazer difícil criar uma estratégia. 

Antes de iniciar o turno escolhemos as ações que cada personagem irá usar, entre os típicos, ataque, defesa, especial, efetuando depois, aliados e rivais, as suas ações. Alguns personagens, como a protagonista Kururu, possuem comandos únicos como o Puppets e Rewards (ataques que usam o poder acumulado numa barra em combate). Os Puppets permitem usar diversos tipos de habilidades em combate, além de reforçar as características de quem os usa. 

Tanto os personagens em combate como os Puppets podem ser equipados com objetos para aumentar as suas capacidades.
O jogo é bastante fácil, no geral. Possui três níveis de dificuldade: fácil, normal e difícil.

Já na terceira entrega o combate também é por turnos, mas um pouco mais complexo. Em combate tens até quatro personagens que podes controlar, contudo, cada um desses quatro personagens pode ter até três ajudantes que, em combate, atacarão por sua conta se assim o desejarem. Podes também prescindir do turno do teu personagem para selecionar uma ação específica para um ajudante realizar. 

Existem algumas regras de como podes formar estas equipas. Também há alguns personagens que ganham mais vantagens em estarem junto a outros.

As ações que podes usar em combate são as mesmas que na anterior entrega, havendo certos personagens com algumas opções extras, como a Cornet (protagonista da entrega original), Kururu, etc.

Todos os personagens (incluindo Puppets e monstros) que se juntam à equipa podem-se equipar com objetos.

Ao seguir uma estrutura por capítulos separados, esta terceira entrega pode não ser do agrado de todos, uma vez que estamos sempre a ter que treinar personagens e a formar novas equipas. 

Em ambos os jogos todos os personagens podem subir de nível, sejam estes humanos, monstros ou Puppets, sendo muito comum estarmos a ver, no ecrã de resultados, as palavras level up. Após o combate existe possibilidade que alguns se juntem à equipa.

Os combates dão-se de forma aleatória em ambos. Acho o número correto, contudo pode causar um pouco de cansaço caso, por algum motivo, não saibamos o que fazer, estando constantemente a aparecer estes encontros aleatórios. Aqui, se calhar, poderia ter sido introduzida uma melhoria para permitir desativar os combates se assim o desejássemos.

A exploração é simples já que os cenários são de reduzida dimensão. Na terceira entrega existem muitos objetos e diálogos escondidos pelas zonas.

Um fantástico RPG para iniciantes, independente da idade… Sempre que o inglês não seja impedimento

Considero ser uma saga perfeita para iniciantes, para entrar no género, tanto pelos seus sistemas simples como pela história e personagens adoráveis. Tenham em conta que os textos apenas estão em inglês.

Um humor bem presente em ambas as entregas.

Som

Um jogo que se caracteriza por ser um RPG musical (a entrega original inclusive recebeu o subtítulo de “A musical adventure“) tem que ter músicas que destaquem. 

Os diversos musicais servem para contar a história/sentimentos tanto de protagonistas e vilões. Temos musicais cheios de alegria, alguns mais motivacionais, com baladas, momentos de ficar com a boca aberta, entre outros, há de tudo um pouco. Se a isto unirmos as fantásticas animações em pixel art que aí acontecem, com todo tipo de personagens a aparecer do nada e a juntar-se à balbúrdia de vozes e animações, temos então peças que desejo voltar a ver uma e outra vez.

A terceira entrega conta com menos musicais que a segunda.

Canta, canta, canta e encanta. Os musicais são o ponto alto da saga

A restante banda sonora está num bom nível, destacando os mais que adequados temas de batalha e das cidades que vão de encontro à estética geral do jogo. 

A OST foi composta por Tenpei Sato, compositor veterano da Nippon Ichi Software, famoso pelas suas composições na série Disgaea e outros jogos desta companhia. 

Os efeitos de som são escassos, destacando apenas aqueles presentes em combate. 

Uma das surpresas destes remasters foi a realização de uma dobragem em inglês, algo que não esperava. É verdade, não existem muitos diálogos com voz, além de umas poucas cenas e gritos de combate, mas, tendo em conta a idade destes jogos e o panorama recente, esperava apenas as vozes originais em japonês.

Agora, com muita pena minha, os musicais ficaram apenas em japonês, aqui sim teriam dado um golpe em cima da mesa, demonstrando toda a confiança no produto.

Demonstrou Rhapsody: Marl Kingdom Chronicles toda a sua força?

Tanto Ballad of the Little Princess como Memories of Marl Kingdom são jogos que se destacam pelos seus adoráveis visuais, personagens caricatos e peças musicais únicas e originais. É na repetição de fundos em masmorras e na forma em que os personagens entram e saem constantemente da equipa, onde estão os seus talões de Aquiles. Eu por cá espero que a NIS America continue a trazer todo o seu catálogo para as novas plataformas.

CONCLUSÃO
Charme remasterizado
8
Bruno Cavaco
Grande apaixonado pelo mundo dos videojogos, destacando a sua predileção por RPGs e jogos japoneses no geral. Licenciado em Gestão de Marketing, continua a planear o caminho que deve seguir. Um fã da Eurovisão dos pés à cabeça.
rhapsody-marl-kingdom-chronicles-analiseRhapsody: Marl Kingdom Chronicles é uma boa remasterização de dois jogos que o ocidente nunca recebeu. Além de uns certos retoques na parte visual, a inclusão de textos e as vozes em inglês tornam acessível ao completo toda a saga Rhapsody, cá por estes cantos do mundo.  Venham descobrir este RPG musical tão, tão charmoso.