Começando com pequenas consolas onde as pilhas foram a principal preocupação, jogar em qualquer lado sempre foi um fascínio onde muitas vezes a diversão é colocada à frente do poder gráfico dos jogos.
Quem não se lembra de andar a roubar as pilhas do comando da televisão para alimentar as máquinas de Tetris e mais tarde pensar ser impossível acabar qualquer jogo porque a Game Gear dava para somente 3 horas de diversão?
É inegável que o mercado das consolas portáteis tem sido dinâmico, em grande parte devido à influência marcante da Nintendo, que soube explorar com êxito um nicho de mercado, gerando consideráveis lucros ao longo do tempo. O icónico Game Boy foi um dos pioneiros nesse impulso, seguido por sucessos como a linha Nintendo DS. Atualmente, a peça central da Nintendo é a Nintendo Switch, uma inovadora consola híbrida que pode ser conectada à televisão, mas também facilmente transportada, oferecendo uma experiência flexível e versátil. Com mais de 130 milhões de unidades vendidas, a Nintendo Switch detém atualmente uma quota de mercado que ultrapassa a soma das vendas da Playstation 5 e das Xbox Series X|S.
Era de se esperar que ao longo destes quase sete anos surgissem novas abordagens ao conceito de consola portátil, com algumas alternativas que ganhassem terreno. No entanto, observou-se um progresso relativamente tímido, com inovações concentradas em nichos específicos, como a emulação e computadores portáteis dedicados a jogos.
O pacote e apresentação
A Asus decidiu apresentar uma consola bem ao estilo da sua linha ROG onde os LED RGB e os cortes retilíneos são bem notórios. Uma escolha marcante para se diferenciar do resto do mercado é sem dúvida a sua cor branca! É impossível não olhar e não identificar logo que se trata de uma ROG Ally.
O facto da cor branca acaba por evidenciar uma das principais características da consola que é o seu ecrã LCD de 7 polegadas. Não seguindo a tendência da tecnologia OLED, este ecrã está sem dúvida no topo da qualidade no que diz respeito aos LCD. Com uma resolução de 1080p e uma luminosidade fantástica, nunca este ecrã ficou aquém dos concorrentes OLED, notando-se apenas em títulos mais vibrantes a diferença do painel.
Apesar do seu aspeto robusto e o seu peso de 608g a consola assenta extremamente bem nas mãos e o seu peso não é de todo notado, mesmo após algumas horas de jogo.
Em termos de input, temos dois analógicos, bastante suaves mas precisos, que são acompanhados por dois anéis LED configuráveis nas cores e efeitos. Os analógicos são assimétricos, ao bom estilo de um comando XBox ou Nintendo Switch.
Os botões direcionais são também suaves e não é de todo difícil encontrar as 8 posições que estão bem delineadas. Quatro botões translúcidos e com alguma cor que apesar de abanarem um pouco ao toque e terem um som um pouco plastificado, cumprem o objectivo e seguem a nomenclatura da Xbox com os clássicos ABXY. Temos também dois triggers nas costas da consola que podem ser configuráveis. Estes triggers são usados para efetuar os atalhos usados em ambientes Windows como uma captura de ecrã ou invocar o Gestor de Tarefas.
Dois botões bumper e dois triggers no topo da consola, estes talvez o ponto menos positivo em termos de feedback, se os bumpers são demasiado rijos, os triggers são moles o suficiente para não se saber com exatidão o ponto de atuação. Um botão dedicado ao menu rápido para o centro de comando do Armoury Crate (atalhos rápidos) e outro para o próprio Armoury Crate. Um botão de menu e outro denominado de view (vulgo botão select). Todos os botões quando pressionados por algum tempo efetuam ações secundárias.
Temos ainda duas colunas estéreo que produzem um som com bastante qualidade para o tamanho que a consola tem. Relativamente ao microfone a ROG Ally vem equipada com um duplo microfone para efeito estéreo.
Existe ainda uma funcionalidade de segurança acrescida no botão de energia que inclui um leitor de impressões digitais completamente configurável através do ambiente Windows.
Numa zona mais escondida temos a entrada ROG XG. Entrada proprietária que permite a conexão de placas gráficas em caixa e conexão XG, como por exemplo, uma RTX 4090! Esta funcionalidade será apelativa para quem usar a consola numa docking station e como computador pessoal.
Na mesma zona temos o leitor de cartões e por fim a entrada USB-C 3.2 com Display Port que fornece também a alimentação da consola que é dada por um carregador de 65W.
A configuração
A configuração inicial da consola assemelha-se à configuração de um portátil, com todas as operações realizadas através do touchscreen, facilitando a criação de uma nova conta Microsoft ou a vinculação a uma conta já existente. A obrigatoriedade da conta marca o início de um dos aspetos mais tediosos da configuração, uma vez que qualquer recurso que desejamos utilizar requer a associação a uma conta. A minha experiência envolveu aproximadamente 3 horas até começar a utilizar a consola de maneira efetiva, incluindo os períodos de instalação do Windows, criação de contas e as primeiras atualizações (aqui a palavra chave é, primeiras).
Assim que entramos no Armoury Crate, somos recepcionados com um breve vídeo introdutório, destacando as principais funcionalidades da consola, apresentando os atalhos, o centro de comando e diversas opções de configuração disponíveis. É evidente que a Asus procura proporcionar ao utilizador uma experiência desvinculada do ambiente Windows no qual a consola opera. Isso reflete-se na implementação de um launcher personalizável que automaticamente identifica os jogos instalados a partir das diversas lojas. Este launcher quer ser o ponto central para jogos na consola, como se fosse um Big Picture da Steam mas ao jeito Asus.
Hardware e apresentação das características
Existem no mercado duas versões da consola, a primeira, mais barata, tem um AMD Ryzen Z1 (um processador de 4nm), 512Gb de espaço em disco e 16 Gb LPDDR5 (6400MT/s ou 1600MHz) memória que irá ser partilhada entre o Sistema Operativo e a GPU.
A segunda versão tem um AMD Ryzen Z1 Extreme, este processador acaba por ter um desempenho cerca de 50% superior à sua contraparte, o que se pode refletir bastante em termos de performance em jogos mais exigentes.
Esta diferença está ligada nas várias alterações feitas ao nível do GPU
- Shading units 256 vs 768 (Extreme)
- Responsável pelo processamento de várias instruções, apesar de não serem os únicos responsáveis, são o core do processamento gráfico
- Texture Mapping Units 16 vs 48 (Extreme)
- Capacidade que um GPU tem em processar texturas e colocá-las em modelos 3D
- ROP 8 vs 32 (Extreme)
- Capacidade que um GPU tem em transferir e processar informação relativa aos pixels (rasterização)
- Ray Tracing Acceleration Cores 4 vs 12 (Extreme)
- Cores dedicados ao processamento de operações que simulam o comportamento físico da luz (sombras, reflexos)
A memória conta ainda com um Memory Boost de 2500 no modelo base vs 2700 do modelo Extreme.
Através do centro de comando é possível configurar a potência que queremos dedicar à nossa sessão de jogos:
- Turbo 25 watts, bateria, 30 com alimentação
- Para jogos realmente exigentes, onde a bateria irá simplesmente voar
- Performance 15 watts
- Para uma experiência em jogos mais recentes a 30fps numa tentativa de poupar bateria para sessões mais longas
- Silent 9 watts
- Para jogos indie e menos exigentes
A utilização do RSR (AMD Radeon Super Resolution) para o dimensionamento de uma resolução 720p para a resolução nativa do monitor de 1080p destaca-se como uma prática essencial em muitos jogos, proporcionando não apenas praticidade, mas também uma melhoria necessária na experiência visual.
Uma consola com Windows
A integração do Windows 11 como sistema operativo na ROG Ally traz consigo uma série de vantagens notáveis para o uso diário. A flexibilidade de instalar qualquer aplicação compatível com o Windows possibilita a reprodução de conteúdo multimédia de diversos serviços de streaming, tanto de vídeo como de áudio. A capacidade de viajar e levar connosco uma biblioteca completa de séries, filmes e música destaca-se como uma das grandes vantagens de não depender exclusivamente de um sistema operativo dedicado apenas a jogos.
No âmbito dos jogos, a ROG Ally oferece a liberdade de não se ficar restrito a uma única loja, ao contrário do que acontece na Nintendo Switch ou na Steam Deck. Na ROG Ally, é possível instalar facilmente plataformas como a Steam, Epic Game Launcher ou a Xbox App, sem a necessidade de seguir tutoriais complexos ou realizar alterações em ficheiros de sistema. Graças à intuitiva integração proporcionada pelo Armoury Crate podemos gerenciar não apenas o desempenho e as opções durante os jogos, mas também otimizar a vida útil da bateria e os efeitos visuais durante as sessões de jogo.
Por último, é crucial considerar a vertente de produtividade da ROG Ally, permitindo a conexão da consola a qualquer monitor e a utilização de periféricos à escolha. Esta funcionalidade transforma a ROG Ally numa espécie de minicomputador, possibilitando tarefas como a leitura de e-mails e a utilização de ferramentas de escritório, ampliando a sua versatilidade para além do ambiente de jogos.
A concorrência
Ayaneo
A Ayaneo, talvez uma marca menos conhecida para muitos, destaca-se por ter sido uma das primeiras empresas a investir em computadores portáteis para jogos com formato de consola. Atualmente, oferece uma variedade de modelos com diferentes funcionalidades, onde o principal desafio pode ser o preço e a indisponibilidade em lojas nacionais.
A marca foca-se na qualidade de construção e mantém um olhar constante para a inovação. Um exemplo notável é um dos seus modelos que apresenta um teclado físico e um ecrã deslizante, demonstrando uma abordagem única e diferenciada no mercado de consolas portáteis para jogos.
Lenovo Legion Go
A Lenovo Legion Go, embora seja um modelo relativamente recente, destaca-se pela sua faixa de preço superior à ROG Ally. O seu diferencial encontra-se na combinação de comandos amovíveis semelhantes aos da Nintendo Switch, projetados com foco em jogadores de FPS (First Person Shooter), juntamente com um ecrã de 8.8 polegadas, neste caso, LCD IPS em detrimento de um ecrã OLED.
Nintendo Switch, Nintendo Switch Lite e Nintendo Switch OLED
Lançada em 2017, a Nintendo Switch está agora na fase denominada “fim de vida”, mas ainda continua a ser uma escolha relevante, especialmente devido ao vasto universo de jogos exclusivos da Nintendo, que permanece como a principal razão para a preferência por esta consola. Com três modelos distintos, o núcleo da consola permanece exatamente o mesmo, sendo as principais diferenças relacionadas à capacidade de ligação à televisão (ausente na Switch Lite) e às características dos ecrãs. A Switch Lite apresenta um ecrã mais pequeno e LCD, enquanto a versão normal também possui um ecrã LCD, e a Switch OLED, como o próprio nome indica, conta com um ecrã OLED.
Steam Deck e Steam Deck OLED
A Steam Deck emerge como a concorrente mais direta da Asus ROG Ally, não só por ter sido a consola a mexer com o mercado, mas também a gama de preços ser semelhante. A Ally, por sua vez, destaca-se pela vantagem do ecrã com maior resolução e pela capacidade de suportar todas as outras lojas de jogos, além da Steam. Qual é a vantagem da Steam Deck? A sua associação à maior plataforma de distribuição de jogos para computador existente (talvez apenas rivalizada pela Xbox), bem como a presença de uma equipa e comunidades dedicadas ao contínuo desenvolvimento da consola. Este compromisso é claramente evidenciado pela revisão recente, na qual todas as melhorias implementadas foram direcionadas para atender às críticas e sugestões da comunidade.
Comparando diretamente as duas consolas é indiscutível a diferença de performance entre as duas. Onde a Steam Deck consegue uma experiência de jogo de uma consola portátil, a ROG Ally consegue a de um computador de média gama. Exemplo disso é a performance num Doom Eternal onde a fluidez de jogo é incomparável entre as duas consolas. Também no Forza Horizon 5 passamos de uma sessão agradável com a Steam Deck para uma versão fantástica na ROG Ally.
Mas… claro que existe um mas. Toda a experiência que a Steam Deck tem em torno da consola está atualmente mais consolidada, sentimos que estamos a utilizar uma consola de jogos e não uma consola, que por acaso corre jogos. A abstração que o Steam OS nos traz e a facilidade de começar realmente a jogar é incrível na Steam Deck.
Outro ponto que acaba por ser diferenciador é o factor da portabilidade. O facto de a Steam Deck ser uma consola menos poderosa faz com que a sua portabilidade seja maior pelo simples facto da bateria durar mais, não só pela mesma ser maior e a consola ter um tdp menor, mas por mentalmente numa consola com menos performance vamos adaptar o nosso estilo de jogo. Se a Asus conseguisse atingir tempos de jogos acima de 2h, sem dúvida que a ROG Ally iria ser “A” escolha.
Pontos Positivos
- A consola assume-se como uma verdadeira potência em termos de hardware no domínio das consolas portáteis, destacando-se como o ponto mais robusto de todo o conjunto. Com um ecrã notável, mesmo não sendo OLED, apresentando uma resolução de 1080p e uma taxa de atualização de 120Hz, a experiência de jogo torna-se verdadeiramente impressionante e distintiva.
- Ainda no hardware, as colunas surpreendem pela sua qualidade, especialmente quando consideramos as dimensões compactas da consola.
- O esforço da Asus em criar um ambiente próprio em torno da consola faz-nos esquecer, por vezes, que não estamos a lidar com um sistema operativo dedicado nem com uma única loja de jogos.
- O ambiente Windows confere uma flexibilidade acrescida para aqueles que desejam ter um único dispositivo capaz de realizar várias tarefas, transitando entre momentos de diversão e trabalho, conferindo à consola uma versatilidade semelhante à de um computador portátil.
Pontos negativos
- O facto de não dispormos de um sistema operativo dedicado pode trazer algumas funcionalidades que podem ser consideradas positivas, mas também serve como um lembrete constante do motivo pelo qual a Steam optou por investir num sistema operativo próprio. A quantidade de contas necessárias para a configuração inicial da consola é notável, assim como as atualizações frequentes que foram realizadas durante o nosso período de utilização. Este esforço da Asus em aprimorar constantemente a experiência é evidente, no entanto, a capacidade de atualizar a consola através da aplicação MyAsus, bem como através do Armoury Crate, com atualizações distintas, somadas às atualizações do Windows e das lojas de jogos, dão a sensação de uma solução algo fragmentada.
- Ainda neste âmbito, deparamo-nos com alguns dos problemas tradicionais do Windows, como aplicações congeladas, o despertar constante da consola após o modo de repouso, e situações em que a bateria se esgota sem utilização durante o dia, além de reinícios inoportunos durante sessões de jogo devido a atualizações do Windows.
- Quanto ao hardware, a principal limitação da Ally reside na sua bateria. Apesar do poder da consola, em jogos AAA, é comum as sessões não ultrapassarem as 2 horas, acompanhadas pelo considerável ruído do sistema de refrigeração. No modo Silent, observamos resultados inesperados, como um desempenho aquém das expectativas em comparação com a concorrência.
Conclusão
A Asus ROG Ally revela-se, indiscutivelmente, uma aposta bem-sucedida para a estreia da Asus no mercado das consolas portáteis. A experiência adquirida com hardware dedicado para jogos em dispositivos móveis foi habilmente transferida para esta consola, refletindo-se nos pequenos detalhes, como a criação de um launcher exclusivo para jogos.
Felizmente, os consumidores encontram-se atualmente com uma variedade considerável de opções no mercado, e a ROG Ally destaca-se como uma escolha capaz de satisfazer a grande maioria dos jogadores. A sua vantagem significativa reside na liberdade de não ficar restrita a uma única biblioteca, diferenciando-se assim da Steam Deck ou da Switch.
Enquanto no âmbito da biblioteca de jogos da Steam, a ROG Ally compete diretamente com a Steam Deck, em relação à Switch, a decisão dependerá muito dos gostos e da biblioteca de cada utilizador, uma vez que ambas as consolas oferecem experiências distintas e complementares, sem se substituírem mutuamente.
Entretanto, em termos de desempenho, a ROG Ally destaca-se, mesmo sem considerar a implementação da ligação ROG XG. Em todos os títulos testados, não houve um único que não apresentou um desempenho notavelmente superior em comparação com a Steam Deck.
Agradecemos à ASUS pelo envio de uma unidade para análise.