A série Schitt’s Creek tornou-se gradualmente numa das mais populares de todos os tempos, especialmente depois de ter sido adicionada ao catálogo Netflix. Tendo sido nomeada e adquirido vários prémios ao longo dos anos, eis que a mesma surge agora na lista dos Globos de Ouro de 2021, pelo que esta batata não podia deixar de a revisitar e dar a sua opinião.
Ficha técnica
Criada e escrita por Eugene Levy e Dan Levy (pai e filho), a série canadiana estreou pela primeira vez na CBC Television em Janeiro de 2015. Consiste em seis temporadas e 80 episódios.
Schitt’s Creek foi filmada inteiramente no Canadá, com o Hockley Motel em Mono como pano de fundo para a pensão da série. A música foi composta por Maribeth Soloman, e existem diversos números musicais ao longo das suas temporadas.
Para além do seu enredo peculiar, escrita genial, e prestações memoráveis, Schitt’s Creek ficou também conhecida pelo seu conteúdo positivo de LGBT+.
Schitt’s Creek
A história segue uma família abastada que, de um momento para o outro, se vê sem nada quando as autoridades confiscam os seus bens devido à fraude cometida pelo gerente da sua prolífera empresa, Rose Video.
A família é, então, obrigada a ir viver para uma pequena vila, Schitt’s Creek, a qual o pai, Johnny Rose, tinha comprado há uns anos para o filho como brincadeira. Os mesmos instalam-se na pensão local, onde terão de se ajustar à nova vida, enquanto tentam arranjar forma de restabelecer a sua fortuna e sair dali.
O elenco
Eugene Levy e Catherine O’Hara interpretam os pais Johnny Rose e Moira Rose, respectivamente. Dan Levy interpreta o filho David Rose e Annie Murphy a filha Alexis Rose. Como elenco recorrente, temos Jennifer Robertson como Jocelyn, Tim Rozon como Mutt, Emily Hampshire como Stevie, Chris Elliot como Roland, Dustin Milligan como Ted, Sarah Levy como Twyla, John Hemphill como Bob, Karen Robinson como Ronnie e Noah Reid como Patrick.
Moira Rose é uma das personagens mais emblemáticas da série, com Catherine O’Hara fazendo um papel soberbo de matriarca excêntrica, egocêntrica, e completamente desligada da realidade. A sua total ausência de instintos maternais faz com a sua relação com os filhos seja supérflua e inadequada, levando aos diálogos mais bizarros e cómicos.
Moira é uma das minhas personagens preferidas, por ser completamente imprevisível e tão diferente do que se poderia esperar de uma protagonista (diria, até, anti-heroína). As suas deixas, personalidade, guarda-roupa e aparência formam um conjunto tão estapafúrdio que é impossível manteres-te indiferente: ou a odeias, ou a adoras.
Johnny é o seu oposto, completando-a na perfeição enquanto esposo e pai dotado e com boas intenções, mas que acaba por, muitas vezes, criar as situações mais hilariantes devido à sua propensão para meter a pata na poça. Este admite que talvez tenha passado demasiado tempo focado nos negócios ao invés de participar na educação dos filhos (apesar de essa escolha lhes ter proporcionado uma vida de luxo) e tenta agora reconstruir essa relação. No entanto, os filhos não têm qualquer intenção de tornar esse processo fácil ou indolor.
Johnny é o mais normal de todos os Roses, e o que tenta desde o início aceitar e tirar o melhor partido da sua nova situação. A sua maior preocupação é manter a família unida e feliz, o que é bastante difícil quando estes não fazem mais nada senão queixar-se e culpar o pai pelos seus infortúnios. É bastante comovente ver como se esforça para ser o melhor pai, marido e amigo possíveis, apesar de raramente ter sucesso. Se conheces Eugene Levy de outros papéis, então sabes o que te espera!
David e Alexis são um duo de irmãos hilariante, sempre discutindo e querendo superar o outro numa eterna guerra pelo holofote, enquanto deixam os pais e todos aqueles em seu redor completamente loucos. Mimados, egocêntricos, superficiais… Enfim, todas as qualidades que ex-herdeiros de um império devem ter, eles têm, e sem filtro.
É de chorar a rir vê-los interagir com o mundo “real” e com pessoas “normais” que não os entendem, mas que se esforçam bastante para os integrar na comunidade, ignorando as suas excentricidades e insolência, mas acabando por os educar ao longo do caminho a respeitarem e aceitarem os outros como são. Gostei muito de ver a progressão da família ao longo das temporadas, do seu crescimento enquanto indivíduos e das relações que se foram formando com os locais, sem, no entanto, perderem as suas peculiaridades adoráveis.
As restantes personagens de Schitt’s Creek são igualmente captivantes: desde a gerente cara-de-pau da pensão, Stevie, que nunca sabes realmente se está a falar a sério ou não, o prefeito da vila redneck Roland, que se torna, ao mesmo tempo, mais repudiante e mais aceitável à medida que a série avança, a sempre positiva Jocelyn, mulher de Roland, que se esforça tanto por agradar os Roses, mas que também não os deixa fazer dela o que querem, a simpática gerente do café Twyla, que é um raio de sol sempre que entra em cena, e até Bob e Ronnie que pouco falam, mas que mesmo assim conseguem obter uma backstory relevante.
Uma personagem que raramente participa, mas que, quando participa, não desaponta, é Rizwan Manji, um agente imobiliário multifacetado a que ninguém consegue ficar indiferente. Resumidamente: todo o elenco é fantástico.
Um projecto de família
Os criadores de Schitt’s Creek (que, por acaso, são o pai e filho na série também) tiveram o cuidado em manter todo o projecto bastante sólido e genuíno, evitando a interferência de Hollywood quando possível, para que se tornasse algo realmente diferente do comum e que pudesse encantar o público.
É difícil imaginar uma história destas conectar com a audiência comum, mas a verdade é que o faz excepcionalmente bem. Isto porque, apesar de o centro do enredo não ser imediatamente relacionável, as situações pelas quais as personagens passam enquanto família certamente clicarão com muitas pessoas de diversas idades e estatutos profissionais. É uma série com valores universais que o esconde muito bem por detrás de um guião completamente estapafúrdio e de perder o fôlego de tanto rir, o que a tornou, certamente, muito mais digestível.
Outra razão pode prender-se com o facto de Schitt’s Creek ser um projecto de família (onde também entra outra Levy, Sarah), onde pai e filho criaram esta história e estas personagens entre si, e lutaram por as manter exactamente como imaginaram, independentemente de orçamentos e pressões feitas pelos estúdios. Até o próprio nome os grandes executivos queriam mudar, por ser demasiado “vulgar”. Algo que iria transformar completamente toda a série, e que os Levy sabiam.
Também o casting foi feito pelos próprios, com alguns actores definidos desde o início (como Catherine O’Hara e Chris Elliot) e outros papéis atribuídos a caras pouco conhecidas, mas secretamente brilhantes. Talvez, por isso, Schitt’s Creek seja uma tão grande lufada de ar fresco.
Prémios
Schitt’s Creek conta com diversos prémios, incluindo um MTV Movie & TV Award, dois ACTRA Awards e dezoito Canadian Screen Awards. É a primeira série canadiana a ser nomeada para um Critics’ Choice Television Award para Melhor Série de Comédia, e a primeira série a receber todos os sete prémios de comédia na história dos Primetime Emmy Awards (durante a 72ª edição).
Esta superou o recorde de mais Emmys ganhos por uma série de comédia numa só temporada, que, anteriormente, tinha sido atribuído a The Marvelous Mrs. Maisel (em 2018). Sabendo tudo isto, é impossível não estares minimamente curioso!
Schitt’s Creek está disponível, na sua integridade, na Netflix.