Distantes são os dias em que era possível aplicar 70% (ou até mais) das nossas horas diárias para jogar, muitas vezes o mesmo jogo, vezes e vezes sem conta, em loop mensal. Sem, correria, sem a doença da pressa.
Hoje, com os dias corridos de vida adulta, as responsabilidades vão acumulando com acrescentados compromissos, e para muitos de nós, o tempo funciona quase de forma recta, sem retorno, com mazelas acarretadas por essa consequência: Ansiedade, stress, apatia.
Os videojogos, ao contrário do que dizem as más-línguas, podem sim ser – e são -, usados como forma de escape de um dia mais chato, menos produtivo, ou até quando estamos mais em baixo, e queremos apenas fugir um pouco da realidade, mesmo com tão pouco tempo diário para dedicar a este passatempo que nos apaixona.
É por este pequeno monólogo melancólico em estado de espírito que me encontro, e por ver tantos colegas e amigos com este problema entre a relação de dia chato e capacidade de produzir, com falta de tempo e aborrecimento fácil, que vos trago a primeira fornada de 10 jogos curtos single-player, com menos de 6 horas, perfeitos para vos trazer novas experiências, essencialmente narrativas, visuais e impactantes, e colocar de parte alguns dos grandes problemas do quotidiano. Nem que seja apenas por um bocadinho.
Firewatch
Começo com Firewatch, por estar literalmente enquadrado em tudo o que mencionei acima. Este título da Campo Santo Productions coloca-nos na pele de Henry, um sujeito de vida padronizada, que após problemas familiares relacionados a saúde, decide tentar escapar mentalmente dos seus problemas, tornando-se um guarda-florestal, como forma de terapia de procura de paz, aventura e liberdade.
Esta experiência narrativa é muito bem escrita e igualmente bem interpretada, e aborda temas como solidão, depressão, melancolia; sempre com uma carga emocional muito forte. É uma experiência linear e curta, podendo ser finalizada em menos de 3 horas.
What Remains of Edith Finch
Imersão. Originalidade. Emoção. Estas são as 3 palavras que definem com subtileza o que é What Remains of Edith Finch. Trata-se de uma experiência narrativa extremamente marcante, e o melhor de tudo para a malta com pouco tempo: Menos de 2 horas. Tem menos tempo de jogo do que muitos filmes.
Assim como Firewatch, não só por se tratar de um título em primeira pessoa do estilo walking simulator, existe muito mais em comum. A Giant Sparrow construiu um elo do mundano entre as personagens e o jogador, e poderás identificar-te com muitas das situações experienciadas nesta obra. Mais uma vez, um glossário de filosofia por trás dos conceitos como morte, família, lembranças.
What Remains of Edith Finch é um conjunto de contos estranhos sobre a família Finch na propriedade Washington. Controlarás Edith, que procura lembranças da sua família na sua propriedade, com histórias que vão do passado distante até ao presente.
Spec Ops: The Line
Não haverá título que te mostre o lado humano do impacto da guerra como Spec Ops: The Line. Esta hidden gem que tinha tudo para ser apenas mais um shooter a glorificar o herói americano, surpreende-nos com uma história muito bem construída, mas acima de tudo impactante, que muitas vezes questiona a tua posição se tivesses naquele lugar.
Com uma experiência curta de menos de 4 horas, este shooter em terceira pessoa transporta-nos até ao Dubai, numa suposta missão de resgate. Velozmente, a equipa Delta percebe que a missão não é o que seria, uma vez que são apanhados no meio de uma longa guerrilha entre um batalhão e um grupo armado de refugiados e locais, além de desastres naturais catastróficos.
Prometo que vais ficar umas longas a pensar no que acabaste de jogar, após terminares este título da Yager e 2K.
Undertale
Engana-se redondamente quem pensa que um RPG tem que ter no mínimo umas 20 horas. Undertale é de facto, um dos raros casos que foge à regra, não só na sua longevidade — que varia de 3 a 5 horas —, como no próprio estilo de role playing game.
Novamente volta-se a enganar quem julga este jogo pela sua capa, ou no caso, pelos seus visuais. De estilo 2D com gráficos simples, este título foi criado apenas por uma pessoa, desde os seus visuais, banda sonora, escrita, o responsável é Toby Fox, que muito provavelmente já merece lugar no panteão dos videojogos.
Após uma grande guerra entre humanos e monstros, os humanos venceram e acabaram por banir os monstros para o subsolo de Monte Ebott, lugar que mais tarde no ano 20XX começa a ficar infame e notório, após rumores de que quem por lá se aventura, nunca mais é visto. Uma criança, a nossa protagonista, decide aventurar-se nesse local e acaba por cair num buraco que dá acesso ao mundo dos monstros, e é assim que tudo começa.
Na era do 4K e até 120 fotogramas por segundo, muitos jogadores que tendem a escolher resolução/gráficos sobre conceito/ideia, dão-se mal em perder alguns dos títulos mais maduros já feitos, com grandes lições de humanidade executados com elementos brilhantes de level design.
Inside
Dos criadores de Limbo, a Playdead brindou-nos em 2016 com um dos melhores jogos independentes já feitos: Inside. De extrema polidez, este brilhante título brinda-nos com uma atmosfera arrepiante, e é precisamente na sua ambientação e atmosfera que está o seu sumo.
Tal como Limbo, a narrativa de Inside é nula. Não existem diálogos, e ainda assim existe muita expressão. Não existem grandes faixas sonoras, mas o silêncio arrebatador é tudo. Não existe grande longevidade, mas 2 horas chegam para experienciar a magia gratificante do minimalismo de Inside.
Katana Zero
Dizem que o primeiro é o mais especial; de facto é. Katana Zero foi literalmente o meu primeiro jogo a ser iniciado na Nintendo Switch, e uma das melhores surpresas de 2019.
Este jogo de plataformas neo-noir pode ser devorado em menos de 3 horas, e se gostas de acção desenfreada, violência, uma narrativa não convencional, e uma pitada de gore, então Katana Zero é o teu tipo de jogo.
Cada combate é uma dança sincronizada, entre a tua espada e os inimigos, e a sua banda sonora electrónica a combinar com o seu visual cyberpunk fazem tudo parecer ainda melhor. Uma experiência curta, a não perder!
Portal
Com uma mecânica de gameplay bastante simples, idêntico a qualquer outro FPS, a grande diferença de Portal com os restantes do género, é que o teu mouse/triggers servem para abrir portais, que podem ser colocados em qualquer superfície do jogo que não seja metalizada. Sim, eu sei que parece muito simples de explicar, mas por se tratar de puzzles que brincam com a física do título da Valve, podes esperar uma experiência mind–blowing, e também um pouco de motion sickness.
Portal é para muitos (e com propriedade) um dos jogos mais especiais que marcaram a indústria, e o que em outra altura fora o seu grande ponto negativo, para este artigo, 14 anos depois, é uma bênção; uma vez que pode ser finalizado com cerca de 1 hora de jogo.
Streets of Rage 4
Como variedade não falta, podemos dedicar Streets of Rage 4 para quem pretende deixar a narrativa um pouco de lado, e tudo o que se tenciona é obter algum regozijo com uns socos, pontapés e quiçá, alguns arremessos. Não é que a narrativa não exista, de facto existe, apenas passa por ser a vertente secundária do jogo, como algo relativamente simples, o maior destaque passa pelo seu verdadeiro core, a jogabilidade.
Este é o quarto título da clássica série do início dos anos 90, e uma carta de amor aos mais de 30 anos da série, trazendo tudo o que os fãs da velha guarda mais gostam, e com a destreza de agradar os recém-chegados.
Com uma arte gráfica lindíssima e uma banda sonora de luxo, Streets of Rage 4 pode ser o teu jogo ideal para descomprimir de um dia mais difícil, com o menor tempo possível.
Unravel Two
A magia de Unravel (2016), agora a dois! Unravel Two recorre frequentemente a dois Yarnys para solucionar puzzles e ultrapassar obstáculos. Aliás, o trabalho de equipa é necessário e não opcional, mesmo no modo individual.
O conceito do primeiro jogo, contudo, mantém-se: os laços que nos unem e que definem as relações que estabelecemos com os outros. De amor, perda, saudade e entreajuda, para além de outros mil e tantos significados que possamos retirar desta aventura.
Pode ser finalizado em menos de 3 horas, e aconselho que convides alguem para partilhar a experiência contigo. É diversão garantida.
Podes consultar a análise do nosso Batata Diogo Ventura, e ficar a saber mais sobre o jogo.
Sea of Roses
Por fim e mais recentemente, deixo-te o jogo Português da Crescent Tea Studios, estúdio fundado em 2020 por André Fidalgo, Andreia Batista e Ariana Parrilha. Trata-se de um título curto que pode ser finalizado em cerca de 3 horas, e encontra-se gratuito na Steam.
Sea of Roses tem um estilo muito peculiar de visual novel com alguns elementos de point and click que aborda questões muito importantes nos dias que correm, desde a violência nas relações, à importância da confiança, amor próprio e auto-estima. A mensagem, como qualidade principal, é acompanhada por uma arte gráfica desenhada à mão de uma beleza singular, tornando tudo mais caseiro com os belos toques subtis de piano que acompanham a jornada de Marion, a nossa protagonista.
Podes consultar aqui a minha análise, caso queiras saber mais sobre o jogo!