Já nos dizia o grande diplomata e filósofo Benjamin Franklin: “Só há duas coisas certas na vida: a morte e os impostos“. Em Death’s Door, de certa forma os impostos ficam de parte, mas por muito que se tente enganar a morte, estagnada neste universo, ela acabará sempre por chegar, foiçada de qualquer maneira, inevitável; tal o rumo natural da vida.

É com base no penoso tema da filosofia da morte que Death’s Door é envolvido, e convenhamos, literalmente a trata por tu. Esta é uma proposta indie, realizada por duas grandes mentes que mais uma vez nos provam que não é preciso um grande orçamento para produzir obras de arte. Os responsáveis são o estúdio britânico Acid Nerve, composto pelos dois grandes responsáveis do jogo: Mark Foster e David Fenn.

Um jogo sobre a morte, cheio de alma e carregado de vida

A associação dos corvos com a morte, azar e mau presságio, é levada a peito em Death’s Door, uma vez que o nosso protagonista é exactamente uma dessas aves tão místicas e curiosas. O estranho mundo de Death’s Door inicia-se com o nosso ceifador a chegar do autocarro (sim, leram bem, é mesmo um corvo que chega de autocarro) para mais um dia de trabalho como ceifador de almas, num mundo em que mais nada morre naturalmente. A sede destes corvos ceifadores funciona praticamente como HUB de todo o jogo e será através de um escritório burocrático e empoeirado que o nosso protagonista recebe a primeira tarefa: ceifar a alma de uma criatura misteriosa e, após o feito, é surpreendido por um corvo velho que lhe explica que aquela alma que acabara de capturar, fora usada por ele como tentativa de abrir a porta da morte, com intuito de devolver a homogenia e o curso do ciclo natural da vida.

A história é contada de uma forma simplista, mas esperem um profundo sentimento de envolvência durante todo o jogo. O universo de Death’s Door tem um charme muito único e apelativo à exploração, onde encontrarão criaturas com histórias únicas para contar, além do seu enredo principal, que por si só bastava para assegurar qualidade.

Com uma direcção de arte charmosa, o visual de Death’s Door cativou-me logo após a apresentação da Devolver Digital na E3. Eu sabia que teria que colocar as mãos neste jogo, tal foi o meu entusiasmo, quando vislumbrei um contraste único nos seus visuais, level design e polidez que a Devolver Digital garante sempre que publica uma destas mágicas experiências independentes.

Jogabilidade competente, com foco na exploração

Começando pela jogabilidade, inicialmente após conhecerem o velho corvo, terão três chefes para ceifar de três áreas distintas. Nesta fase, o padrão é essencialmente o mesmo: recuperar as 4 almas perdidas dos corvos que tentaram realizar o vosso trabalho com insucesso. Após se recuperar as 4 almas, uma porta abrirá, que vos levará até um baú com um desafio de combate. Após superar esse desafio, uma nova habilidade é concedida ao corvo, que servirá para avançar até ao chefe final de cada área.

Após ganharem essas novas habilidades, poderão explorar áreas outrora inacessíveis e completamente opcionais. Estes pedaços de terreno e caminhos para explorar são muito gratificantes pela descoberta de novas armas e especialmente por santuários, que vos darão cristais, para aumentar a vossa vida, ou magia. Assim que tenham 4 desses cristais em posse, um novo slot ficará disponível e auxiliará a vossa jogabilidade. Mais uma vez, algo que já verificamos na saga Zelda, uma das maiores fontes de inspiração de Death’s Door.

Também ao ceifarmos as almas de cada inimigo básico que navega pelas áreas dos mapas, podemos absorvê-las e usar como troca para evoluirmos o nosso corvinho, com mais poder de ataque, poder de magia, velocidade e destreza. Talvez por motivos de acessibilidade, os desenvolvedores não investiram tanto nestas melhorias, uma vez que são quase insignificantes. Comecei por juntar todas as almas para evoluir totalmente a velocidade, e sinceramente pouco notei a diferença. Já no poder de ataque foi praticamente a mesma situação. Dito isto, se não forem jogadores com grande paciência para explorações, irão sair-se muito bem à mesma.

O combate é fácil de aprender (acessível para todos) mas pode ser desafiante principalmente com alguns inimigos mais resistentes. Poderão atacar, desviar rebolando pelo chão, carregar um ataque longo e mais poderoso, ou atirar magia. Apesar da sua facilidade de domínio, há que ter em conta que não existe cura automática e, caso sejam atingidos umas poucas vezes, certamente verão o ecrã de game over. As únicas maneiras de restaurares os teus pontos vitais serão plantando sementes que encontramos ao longo do jogo, ou voltando ao local de trabalho pelas portas de checkpoint.

A banda sonora comanda toda a experiência

No meio destes biomas, não esperem apenas combates. Existem também segmentos de quebra-cabeças muito bem conseguidos, com a dose certa de desafio. O suficiente para que não vos aborreçam de tamanha facilidade e descaso na sua construção e muito menos desafiadores ao ponto de desistirem de jogar. Os quebra-cabeças deste jogo brincam muito com o timing e lógica, as duas grandes bases para qualquer um desses puzzles que encontrarão na jornada.

Death’s Door é um título tão consolidado em tudo o que nos oferece, que pouco precisava para melhorar ainda mais a experiência, e ainda assim entrega uma das bandas sonoras mais belas e intrigantes que ouvi desde Nier Automata. Transmite-nos paz, tristeza, esperança e serenidade, tudo com muita essência. Todas as faixas são apropriadamente colocadas nas três distintas áreas, em especial no forno gigante, em que a sincronia está no expoente máximo com o ritmo certo, entre os obstáculos e a música. O Tom de cada faixa comanda toda a experiência. A obra sonora é composta por David Fenn e podes saber mais sobre os seus trabalhos a partir desta ligação.

Death’s Door encontra-se disponível para as plataformas Xbox Series XXbox One e PC.

Agradeçemos pelo código, que foi cedido gentilmente pela Devolver Digital.

CONCLUSÃO
Brilhante
9
Igor Gonçalves
Curioso, explorador, e fã de videojogos desde que me lembro, e em especial pela saga Metal Gear. Não jogo plataformas, jogo jogos.
deaths-door-analiseDeath's Door é um jogo épico, cheio de alma, e uma das grandes surpresas do ano. Por muito que o seu tema possa ser complexo, a história é sempre contada de forma descontraída, minimalista e com reflexões camufladas. De visuais e banda sonora deslumbrante, combate simples e a incentivar a exploração, poderão ter aqui cerca de 8 horas da dose certa de um dos melhores jogos do ano.