Durante anos, os jogos indie foram vistos como uma alternativa mais modesta aos grandes lançamentos, sempre muito desvalorizados; algo para jogar enquanto não saem os poderosos AAA como um Grand Theft Auto ou Assassin’s Creed. Hoje, é impossível ignorar que são precisamente os estes títulos que estão a carregar a tocha da criatividade e da inovação na indústria, e isso considero um facto.

Este é um fenómeno estranho: Grandes estúdios afundam-se em fórmulas testadas, loops seguros como os shooters anuais de um Call of Duty desta vida, e jogos cada vez mais genéricos e repetitivos, muitas vezes com orçamentos de centenas de milhões; e ainda assim parecem todos iguais. Muitos destes resultados estão à vista, estúdios encerrados e liberdade criativa condicionada. O maior exemplo recente deste panorama é a Ubisoft. Não sou ingénuo para afirmar que esta gigante da indústria se está a afundar só porque muitos dos seus jogos são todos iguais, mas é um facto que muitas das suas escolhas já não causam impacto, jogando sempre pelo seguro, e falhando redondamente. A receita parece ter perdido força — basta olhar para o cancelamento de projcetos, resultados financeiros abaixo do esperado e falhanços comerciais como Skull and Bones, um jogo que virou um meme da internet como o suposto primeiro AAAA da indústria. Infelizmente este é um exemplo de tudo o que está errado numa indústria obcecada em prolongar ideias gastas em vez de arriscar algo novo.

É por isto que procuro hoje em dia os títulos independentes. Estes são jogos que não têm medo de arriscar. E mais do que isso: conseguem-me emocionar, surpreender e alguns até já redefinem géneros inteiros. E qual é a raiz deste problema? Honestamente, não consigo entender, mas consigo pensar em algumas bases. Hoje em dia, um título AAA pode custar mais de 100 milhões de dólares, sem contar com custos de marketing. É quase o orçamento de um grande filme de Hollywood. Quando tens tanto dinheiro investido, a margem para falhar é mínima. Alguns dos gigantes estúdios são também cotados em bolsa, como a Ubisoft, Electronic Arts, Take-Two, Activision Blizzard; o que causa uma pressão maior já que os investidores esperam lucros estáveis e crescentes todos os anos. Arriscar numa ideia nova que pode falhar, é mais arriscado do que repetir uma fórmula que já provou funcionar.

Já um estúdio indie é pequeno, não tem acionistas a controlar cada decisão, e o orçamento é muito menor. O risco existe (como é lógico), mas não envolve despedir centenas de pessoas ou abalar a bolsa de valores em caso de falhanço. Podem arriscar numa arte pixelizada, num tema estranho ou mecânicas nunca vistas, e se correr mal; bem, perdem dinheiro (estudassem); se correr bem: profit e oportunidades futuras.

O motor dos estúdios indie não é só a necessidade de ganhar dinheiro, é uma necessidade quase obsessiva e apaixonante de contar uma história, criar uma mecânica diferente, fazer algo que nunca foi feito. Muitos estúdios independentes começam em casa e garagens, alguns até a solo, muitas vezes financiadas do próprio bolso ou por crowdfunding. Não há lixeira corporativa, o combustível é a paixão. O jogo é pessoal, é uma extensão da visão dos seus criadores.

A oferta hoje em dia é intensa para quem se aventura nos mercados mais pacatos, mas posso dar alguns exemplos concretos: Hades, da Supergiant Games, recentemente renovou o interesse nos roguelikes, sem comprometer profundidade do estilo. Hollow Knight, feito por uma pequena equipa Australiana, construiu um mundo desafiante e mais atmosférico do que muitos jogos com dez vezes o seu orçamento, e hoje é um dos jogos mais esperados, e virou até um meme nos cartões de bingo da malta preenchidos antes dos eventos de apresentação. Celeste, é outro título de plataformas que apesar de ser extremamente desafiante, lida com temas como ansiedade e depressão, fazendo a ponte destes dois elementos com a jogabilidade de uma forma quase poética.

E não faltam histórias fascinantes neste mundo independente. Stardew Valley, por exemplo, nasceu de um único programador, Eric Barone, que durante quatro anos trabalhou praticamente sozinho para criar o sucessor espiritual de Harvest Moon. O resultado? Um fenómeno global, milhões de cópias vendidas, zero estúdios gigantes por trás, e um feito impressionante — conseguiu fazer com que a minha irmã pela primeira vez gostasse de um videojogo, e acreditem, são 20 anos sem nunca tocar em praticamente nada, a não ser no minicilip nos seus tempos de criança.

Outro caso curioso é Undertale, criado por Toby Fox praticamente sozinho, que com um orçamento mínimo conquistou uma legião de fãs e tornou-se um marco cultural, provando que nem todos os RPGs precisam de gráficos de última geração para criar universos ricos e personagens inesquecíveis. E podíamos ficar aqui o dia todo: Papers, Please de Lucas Pope, Cuphead criado pelos irmãos Moldenhauer, que se despediram e hipotecaram as suas próprias casas para financiar a animação à mão; ou a febre do Among Us, o jogo que explodiu do nada durante a pandemia.

É isto que me faz acreditar que, enquanto os AAA fazem contas, os indies fazem magia. Jogos pequenos, equipas pequenas — mas impacto gigante. A indústria mainstream pode continuar a jogar pelo seguro, mas eu sei onde está a faísca que ainda me faz ligar o PC e a consola sem medo de me sentir a jogar mais do mesmo. Obrigado para todos os estúdios independentes que me fazem continuar a amar os videojogos. Espero estar cá durante muitos anos para o continuar a fazer; e apoiar cada um de vocês!

Igor Gonçalves
Curioso, explorador, e fã de videojogos desde que me lembro, e em especial pela saga Metal Gear. Não jogo plataformas, jogo jogos.