Cada vez que recebo um título para análise que envolve mitologia, tenho de fazer muita força para tirar as palas que me ofuscam a visão, tal é a alegria que tenho em estudar esta arte. Ora, esta mesma força teve de ser aplicada na minha última aventura em Titan Quest II. Após o imensamente bem sucedido Titan Quest, iniciamos uma nova aventura, igualmente baseada na mitologia grega, mas agora com um fio narrativo mais consistente.
A narrativa decorre ao passo de Nemesis, a deusa grega da retribuição, que decide reescrever o destino. Ao invés dos tradicionais RPGs, onde o vilão surge pontualmente e se apresenta no fim como o derradeiro desafio, Nemesis faz questão de estar constantemente presente, e de interferir em vários momentos da história. Esta abordagem acaba por também trazer um tom mais leve ao decorrer dos acontecimentos, tocando em desenvolvimentos mais “fantásticos”, do que as tradicionais opressões divinas.
Tal como na narrativa, também no mundo é este o tom que lidera a apresentação. Como a história está dividida em atos, cada ato é caracterizado pelo local onde decorre, sejam aldeias costeiras com inimigos marinhos ou altares assombrados pelos mortos, entre outras surpresas que não quero estragar. Na sua essência, cada área acaba por servir um capítulo no ciclo mitólogico. As personagens secundárias também se entrelaçam de forma coerente. Os deuses surgem imprevisíveis, mas mantendo sempre uma presença que se sente maior que a vida. Também as missões secundárias, ainda que estranhas, como devolver um jarro ao seu lugar certo, trazem peso narrativo, seja pela forma como se enquadram no desenvolvimento do mundo, ou simplesmente pela consistência na escrita.
As cidades servem como ponto principal de troca e atribuição de missões, e o resto do mapa (cerca de 95%) é, muito resumidamente, território para matança. Com isto quero dizer que, tirando a cidade, podemos simplesmente estar passear por uma aldeia quando somos emboscados por inimigos, ou simplesmente vermos um NPC a tratar da sua lida, surgindo desafios e atividades ao sabor do vento. Entre vastas planícies e cavernas, surgem sempre caminhos alternativos que nos levam a equipamentos ou armas incríveis para a nossa build, ou, boa parte das vezes, um capacete com raridade comum, mas já sabem como é nestes RPGs, faz parte. A variedade dos inimigos também respeita a narrativa, no sentido em que tanto pode ser humana ou fantástica. Desde tribos humanas que procuram expandir territórios a caranguejos, zombies ou aranhas gigantes, não falta variedade para obliterarmos.
O combate é mais pesado que os congéneres, prioritizando uma vertente mais tática do que o famoso hack-and-slash. Este **traz as suas falhas, como a deteção de golpes parecer imprecisa, e o impacto deixar um pouco a desejar. Ainda assim, mesmo com estas limitações, as abordagens táticas são bastante importantes, dado que os inimigos recuam, chamam reforços, ou nos tentam flanquear, algo que aviva o combate, e nos faz abordar as batalhas de forma ponderada assim que vemos os inimigos surgirem no horizonte.
Fiquei também bastante surpreendida com a atenção aos detalhes estéticos. O cinto da nossa personagem por exemplo, carrega visivelmente as nossas poções de cura, o que não é revolucionário, mas acrescenta sempre um detalhe que nos faz apreciar este trabalho extra. Inclusive, em certos locais, o enquadramento da câmara muda para que possamos absorver a vista panorâmica, com a imagem a recuar para nos proporcionar um momento de admiração do fantástico.
Honestamente, no desempenho, não tive quaisquer problemas. Com uma RTX 4060 16GB e um i7 11700K, o jogo pouco saltitou, mantendo pelo menos 60 fotogramas estáveis. O inventário também surge bastante simplificado, deixando-nos concentrar na vertente estratégica. Apenas preferia versões melhoradas das poções, mais concretamente no tempo de recarregamento, porque o que há simplesmente não chega.
A equipa ainda anunciou atualizações grandes a cada trimestre, como um criador de personagens mais personalizado (confesso que o atual é muito básico), mais áreas e expansão da história, garantindo que não haverá microtransações, apenas expansões completas.
Titan Quest II captura a maravilha de forma mítica. Com cerca de 10 horas, completamos a versão Early Access, mas já nos deixa bastantes margens para replayability, tendo já uma base robusta para variação de classes. Ao mesmo tempo, é nos pedida paciência, tanto em formato de mensagem escrita, como em certos momentos onde os astros se desalinham. Com certeza surgirão os momentos onde se resolve a otimização, o feedback de combate e os polimentos finais.
Agradecemos gentilmente à editora por nos terem cedido uma chave para análise.





























