Resident Evil, um nome que, na indústria de videojogos, praticamente não requer qualquer introdução, sendo uma das grandes séries que popularizou o famoso Survival Horror, com o seu início em 1996 na mítica Playstation.
O sucesso da série foi algo praticamente imediato, gerando várias sequelas e spin-offs ao longo dos anos, atingindo um sucesso enorme recentemente com Resident Evil 7, Resident Evil Village, o remake de Resident Evil 2, e claro, o jogo que vos trago hoje, o remake do tão inovador Resident Evil 4.
Lançado em 2005, inicialmente em exclusivo para a Nintendo Gamecube, mais tarde para a Playstation 2, e, eventualmente, para todas as plataformas existentes à face da terra, Resident Evil 4 foi um jogo que mudou por completo a indústria dos videojogos. A cinematografia, os gráficos, e a jogabilidade eram simplesmente surreais, sendo um jogo que, mesmo nos dias de hoje, se consegue sentir a influência, com jogos como o God of War: Ragnarok e Dead Space sendo apenas 2 exemplos de jogos que incluem aspetos que originaram do Resident Evil 4.
Em busca da filha do presidente
Em Resident Evil 4, voltamos a tomar o papel de Leon Scott Kennedy, um dos protagonistas de Resident Evil 2, que, após o incidente em Racoon City, foi promovido a agente federal. O Leon tem uma missão de elevada importância: salvar Ashley, a filha do presidente. No início do jogo, temos o nosso protagonista a dirigir-se para uma zona remota na Espanha, com o intuito de conseguir encontrar Ashley perto desta localização.
Ora que, ao entrar numa das casas e encontrar-se com um dos residentes locais, Leon apercebe-se quase imediatamente que algo está errado, pois é atacado de uma forma selvagem pelo residente por fazer uma pergunta simples. Este pequeno encontro é uma excelente forma de reforçar a atmosfera no início do jogo, dando a entender que esta missão não vai ser algo simples, com uma grande responsabilidade para Leon.
Para quem já jogou o original, o remake mantém uma grande parte da história intacta, com algumas mudanças, adições, e algumas partes removidas. Felizmente, não temos aqui uma situação semelhante ao remake de Resident Evil 3. Por cada parte removida do original, temos uma ou mais partes adicionadas, com o objetivo de dar um maior contexto ou foco a personagens menos desenvolvidas do original. Eu penso que a maioria das mudanças foram benéficas, fazendo com que a história, desta vez, tenha um progresso mais coerente.

Penso que os diálogos também estão vastamente melhorados. O remake traz-nos uma tonalidade mais séria, mas não deixamos de ter alguns famosos “quips” intemporais do protagonista, fazendo com que a tonalidade tenha sido apenas ajustada, não se afastando demasiado do tom icónico do original.
O RE Engine continua a impressionar
Temos de volta o famoso RE Engine a proporcionar-nos com uma fidelidade bastante elevada, fazendo com que a aldeia e os cenários do jogo original tenham um detalhe bastante mais elevado. As animações são excelentes, com os inimigos a reagirem aos disparos de uma forma bastante realista. Se disparares com uma arma mais potente, como uma shotgun, o desmembramento é impressionante, por vezes até a dividir os inimigos ao meio, com as entranhas visíveis no modelo já derrotado.
Já sendo comum do motor, também temos uma fantástica qualidade nos modelos das personagens, tendo um aspeto quase real, sendo praticamente um upgrade massivo dos modelos originais, especialmente no que toca ao Leon e à Ashley.

Em termos técnicos, temos alguma inconsistência de desempenho, algo que se irá notar mais no modo de resolution com o ray tracing ligado, onde irás notar várias quedas de fotogramas, para algo perto dos 30 fps. Penso que poderia ter sido algo mais polido, considerando que o jogo também está disponível para a Playstation 4.
Independentemente do que escolhes, vais ter sempre situações onde a frame rate sofre umas quedas. Penso que isto é um pouco desapontante, considerando que, no caso do Resident Evil Village, praticamente tinhas o jogo quase sempre a 60 fps estáveis, mesmo com o ray tracing ativo. No que toca ao Resident Evil 4, temos até uma situação onde o ray tracing é bastante inferior a Resident Evil Village, não tendo qualquer implementação de iluminação global e sombras, sendo apenas exclusivamente usado para melhorar as reflexões.
Como sabem, esta parte técnica geralmente não tem impacto na minha nota final. O jogo é perfeitamente jogável no estado em que se encontra, sendo apenas algo mais informativo para os curiosos.

Independentemente dos problemas, temos mais uma entrada da série com gráficos praticamente de topo, utilizando as forças do motor para nos proporcionar uma experiência visual incrível.
O Action Survival Horror modernizado
O Resident Evil 4 original foi um jogo que adicionou um toque de ação à fórmula do Survival Horror, proporcionando um combate mais focado e dinâmico que o típico do género. Leon era capaz de pontapear e fazer suplex aos inimigos, e o jogo estava recheado de set pieces, muitas vezes de caráter ridículo, como se fosse um filme de ação típico da era.
No remake, apesar de termos um foco um pouco mais sério na sua apresentação, a equipa decidiu manter o combate de ação, e modernizou-o de modo a estar atualizado com os jogos modernos. O Leon, desta vez, consegue disparar e mover-se em simultâneo, e o seu movimento tem peso, com a personagem a inclinar-se para fazer curvas apertadas enquanto corre. Temos os pontapés e suplex de volta, desta vez com animações mais fluídas. O impacto sentido a cada tiro e pontapé é incrível, com um feedback sonoro e visual bastante amplificado, fazendo com que Leon pareça quase um super-homem.

O combate do remake, na minha opinião, está bastante superior ao original. O simples fato de nos podermos movimentar e disparar simultaneamente dão um dinamismo novo ao jogo, fazendo com que estejas em constante movimento, tentando dançar pelos inimigos à procura do ângulo perfeito para atordoar um inimigo perto de um grupo, de modo a poderes pontapear o grupo inteiro de uma só vez. Muitos dos truques presentes no jogo original passaram para este remake, juntamente com uns novos, e tudo flui de uma forma incrível, obviamente amplificada pelas animações excelentes que a equipa deu ao protagonista e aos inimigos. Algo que também melhora a dinâmica do combate é o fato de já não ser preciso aceder ao inventário para trocar de arma, sendo apenas preciso usar os botões direcionais, fazendo com que o combate não seja interrompido constantemente por pausas para fazer algo tão simples.
Algo que foi mudado drasticamente foi a faca. No jogo original, a faca era apenas uma ferramenta adicional que servia como uma forma de poupar balas, atacando os inimigos quando eles estão no chão vulneráveis. No remake, a faca agora é uma ferramenta de defesa indispensável. Quando um inimigo te ataca, tens a possibilidade de fazer parry ao ataque com a tua faca, e, dependendo do teu timing, podes fazer um parry normal, que apenas te defendes do ataque, ou um perfect parry, onde o inimigo fica atordoado, com a possibilidade de lhe dar um pontapé. A faca agora tem também uma durabilidade, sendo que tudo o que fazes com a mesma gasta esta durabilidade. Se fores agarrado por um inimigo, podes usar a faca para escapar, mas isto gasta bastante durabilidade da tua faca. Considerando as capacidades defensivas da faca, a gestão da durabilidade é uma mecânica nova central para o remake, e uma extremamente satisfatória e bastante efetiva.
Independentemente da situação, combinar todas as ferramentas que Leon tem à sua disponibilidade neste remake fazem-te sentir praticamente um protagonista badass de um filme de ação. A satisfação que se tem ao conseguir derrotar um grupo de inimigos juntando disparos, pontapés, granadas e uma boa dose de gore ao desfazer um inimigo com a shotgun, é algo que me deixou constantemente com um sorriso na cara.

Devido a este combate modernizado, os inimigos também tiveram de ser regulados, de modo a manter a jogabilidade desafiante. Para quem jogou o original, vai imediatamente reparar que os zombies e monstros que irás encontrar no remake são muito mais agressivos. Eles não irão dar espaço nenhum ao Leon, estando constantemente atrás dele. Eles atacam, empurram, agarram, e, se for preciso, até cooperam entre eles, agarrando o protagonista por trás, de modo a estar vulnerável a um ataque frontal de outro inimigo. A agressividade é deveras intensa, praticamente fazendo com que várias secções de combate sejam um caos total. Algo que também foi ajustado, foi o número de inimigos, com várias secções a ter um número maior de inimigos em simultâneo, o que aumenta ainda mais o caos presente no ecrã.
Este combate modernizado traz consigo também uma dificuldade aumentada. No jogo original, haviam muitos truques que se podia aprender que facilitavam a jogabilidade bastante, e os inimigos mais passivos davam mais tempo ao jogador para poder refletir numa estratégia e agir sem muita pressa. Algo que também acresce a dificuldade é o fato de nem sempre conseguires deixar um inimigo atordoado para lhe pontapeares com apenas um tiro na cabeça ou pernas, havendo agora um pouco de um fator aleatório no mesmo. Este fator aleatório está menos presente nas dificuldades mais baixas, como a Assisted e Standard, mas, nas dificuldades mais altas, irás reparar que os inimigos conseguem aguentar muito mais os teus tiros de pistola. Apesar destas mudanças, o remake conseguiu manter a jogabilidade mais constante, não havendo tantas situações de frustração que estavam presentes no original.
Temos de volta também o icónico merchant, que mantém a mesma função de te dar upgrades e armas novas para poderes comprar com o dinheiro que irás apanhar durante o jogo. Os upgrades das armas são extremamente importantes para facilitar a tua missão, sendo que estes aumentam estatísticas da tua arma como o dano, balas no cartucho e o quão rápido recarregas a arma. Todas as armas também usufruem de um upgrade exclusivo, como duplicar o dano, ou aumentar as chances de conseguires dar um crítico, praticamente matando um inimigo instantaneamente.

Algo novo que o merchant traz neste remake são as side quests. Estas geralmente envolvem tarefas básicas e rápidas, como disparares num certo número de medalhões azuis escondidos numa zona do mapa, ou ires matar um inimigo forte. Ao completares estas missões, és premiado com spinels, que agora servem para trocares por vários itens, como por exemplo:
- Acessórios para as armas: acessórios opcionais como stocks, que melhoram a precisão das armas;
- Mapas de tesouros: Os mapas dos tesouros de cada área estão disponíveis aqui, e são bastante úteis;
- Exclusive Ticket: Estes tickets conseguem desbloquear um upgrade exclusivo para uma das tuas armas a custo zero, o que é extremamente útil.
Estes são apenas 3 exemplos do que podes trocar por spinels com o merchant, havendo ainda mais itens que irão sem dúvida ser-te úteis na tua missão para salvar a Ashley. Eu adorei esta adição, fazendo com que as várias zonas que exploras não sejam apenas de passagem, algo que era comum no original. Desta vez, os mapas são feitos como uma espécie de hub, havendo mais exploração envolvida com os mapas a manterem-se exploráveis com atalhos e vários caminhos, mas mantendo alguma da linearidade do original.

E, já que estamos no tópico de exploração, temos as mudanças em torno do level design. Aqui temos algumas mudanças mais drásticas. Muitas das zonas do original são reconhecíveis, com a equipa a tentar manter o layout bastante semelhante. Algo que irás reparar facilmente, é que as zonas estão mais claustrofóbicas, mas, ao mesmo tempo expandidas. Explicando melhor, foi aumentado a densidade das zonas, mas cada secção foi modificada, de modo a torná-las mais apertadas, o que resulta em situações mais intensas e uma atmosfera mais focada em terror.
E agora, falando da Ashley. No remake, podes mudar o comportamento da Ashley entre manter-se perto do Leon ou estando mais afastada, mas continuando a seguir na mesma. Quando queres lutar numa zona e manter a Ashley fora do caminho, de modo a evitar atingi-la com granadas, ou tê-la a bloquear o caminho, podes indicá-la para se manter afastada. Caso estejas a fugir de inimigos ou a reposicionar-te e queiras que a Ashley se mova mais rápido, podes indicá-la a manter-se mais próxima. Quando funciona, estas mudanças novas fazem da Ashley menos frustrante que o original. Infelizmente, por vezes, há situações onde a inteligência artificial dela não reage da melhor forma, com ela agachada perto dos inimigos sem se mover, sendo facilmente agarrada, por exemplo. Também há situações onde, estando indicada para estar próxima de Leon, ela simplesmente desiste por si e cria distância, fazendo com que seja novamente agarrada por um inimigo. Quando Ashley é agarrada por um inimigo, o mesmo a leva para longe de Leon, onde tens um tempo limite para disparar ou esfaquear o inimigo, de modo a este libertá-la.
Considerando a importância de manter a Ashley em segurança, estas situações podem criar alguma frustração. Felizmente, são situações raras, com as animações e o movimento da Ashley sendo mais realistas e autênticos.

Tens de volta o clássico sistema de crafting com ervas, onde podes juntar ervas de várias cores para fazeres curativos. Algo que foi adicionado neste remake, foi a possibilidade de criar balas, granadas e outros itens com o uso de resources, que, juntamente com gunpowder e facas, podes criar balas e granadas, havendo uma maior facilidade de obter os recursos necessários para qualquer situação.
Tensão sonora constante
A música do Resident Evil 4 original tinha um foco sinistro que ajudou a definir a atmosfera única do jogo. No remake, temos a mesma ideia, mas desta vez a música aumenta a tensão pelo dobro ou talvez o triplo. A orquestra pesada, com um instrumental confiante e agressivo, fazem com que a música puxe o jogador para um estado constante de caos. Penso que este arranjo orquestral complementa perfeitamente o combate moderno, com a sua dinâmica mais ativa e os inimigos mais agressivos.
Acrescenta-se também a qualidade do áudio do jogo, com os inimigos constantemente aos gritos e a reagir à posição do jogador, o caos sonoro durante as batalhas é deveras um tsunami que irá manter-te sob pressão durante a duração das mesmas.

Um remake que não substitui o original
Analisar este jogo foi uma tarefa extremamente difícil. Para alguém como eu, um fã extremo do jogo original, que o jogou durante a era do seu auge, é possivelmente tudo o que eu queria e ainda mais um pouco. o remake de Resident Evil 4 pegou em tudo o que fez o original único e manteve a sua identidade, adicionando e modificando o que era preciso para fazer desta uma experiência moderna e mais coerente com a sua história.
Este remake, obviamente que não revoluciona nem inova como o original, e, para quem nunca o jogou, esta é sem dúvida mais uma entrada em cheio na série, com uma qualidade equiparável aos Resident Evil que saíram nos últimos anos.
Algo que tem sido bastante óbvio no que toca aos últimos remakes da série, é que não se está a tentar substituir os originais, mas reimaginá-los de uma forma única e diferente. Obviamente que Resident Evil 4 não foi um remake tão drástico como o de Resident Evil 2, por exemplo, mas não deixa de ser impressionante o trabalho que a equipa fez.

Penso que pegar num jogo que mudou a indústria inteira e tentar relançá-lo desta forma é algo que poderia sem dúvida correr extremamente mal. Capturar a essência de algo que já foi, especialmente ao nível de Resident Evil 4, não é fácil.
A minha experiência com este remake tem-se sentido quase como se voltasse atrás no tempo, como se estivesse a experienciar de novo um jogo que tanto me impressionou na primeira vez que o joguei. Para alguém que jogou o original tantas vezes ao ponto de perder a conta, penso que é algo que se pode elogiar.
E com este remake, muito provavelmente, será a mesma situação. Ao chegar ao final e ver os créditos a passar, não me senti com vontade de pousar o comando e passar para o próximo jogo. Assim que os créditos acabaram e voltei ao menu, não perdi tempo nenhum, e lá fui eu outra vez para este mundo de Action Survival Horror, pronto para experienciar mais uma vez um dos meus jogos favoritos, mas desta vez, um dos meus outros jogos favoritos (isto vai-se tornar confuso).
O presidente está a chamar-te, pois terás de ir salvar a Ashley em Resident Evil 4 Remake, para Playstation 5, Playstation 4, Xbox Series X|S e PC na Steam.